Profissões para mulheres e outros artigos feministas é um livro de Virginia Woolf (1882 – 1941) que contém sete ensaios questionadores e provocadores em relação às mulheres na sociedade e no mercado de trabalho. A forma como a autora conduz o seu raciocínio, colabora para a compreensão do movimento feminista, desde seu primórdios aos dias de hoje, o que nos revela uma escritora muito à frente de seu tempo.
Uma briga
Em 1905 Virginia Woolf escreveu uma resenha para o The Guardian sobre “A nota feminina na literatura“, de W. L. Courtney, que, entre outras ideias tolas, afirma que mulheres não fazem literatura de qualidade. A resposta de Virginia Woolf – clara e objetiva – reduz o pensamento de Courtney e então, fica marcado nesse texto, a sabedoria dela perante o cômodo mundo patriarcal de sua época e o quanto ela estava a frente. E de novo, em 1920, o romancista Arnold Bennett publicou ensaios sobre a “inferioridade intelectual das mulheres”, o que fez Virginia Woolf parar de escrever O quarto de Jacob, para responder o escritor, que a responde de volta, e ela responde novamente até que ele desiste da “briga”.
Comento esses dois texto para usá-lo como o ponto de partida do feminismo de Virginia Woolf, o que ela fez foi se incomodar com a publicação desses textos e então rebatê-los com a sua sabedoria nata – de uma mulher que não frequentou a escola e recebeu educação em casa.
Ao lê-los, principalmente esses dois primeiros, fica evidente o seu impulso em querer esclarecer as coisas, em narrar no sentido de informar e não diminuir a imagem do outro, como fez os dois escritores em questão. E eu gosto muito dessa postura, como ela mesma registrou em Orlando “Nenhuma paixão é mais forte, no peito humano, que o desejo de impor aos demais a própria crença”. Ou seja, quando queremos expôr a nossa opinião deve-se levar em conta a base dela, que não pode estar numa prova banal que o outro lado está errado.
Percebi que a resposta de Virginia Woolf para esses dois artigos caminham tranquilos sobre esse ponto, sem bater de frente, mas plantando dúvidas, ela faz com que o leitor – atento – fique do lado dela, com orgulho.
Além desses dois artigos, há muito mais no livro. Um deles é “Profissões para mulheres“, que me emociona toda vez que leio, um texto que ela leu para a Sociedade Nacional de Auxílio às Mulheres em 1931. Nele, ela discorre sobre o motivo de estar ali, falando para mulheres trabalhadoras, pois não se sente com infinitas experiências profissionais, mas percebe a oportunidade de contar um pouco sobre como é ser uma mulher escritora. Abaixo um pequeno trecho (que foi difícil escolher):
“E, quando eu estava escrevendo aquela resenha, descobri que, se fosse resenhar livros, ia ter de combater um certo fantasma. E o fantasma era uma mulher, e quando a conheci melhor, dei a ela o nome da heroína de um famoso poema, “O Anjo do Lar”. Era ela que costumava aparecer entre mim e o papel enquanto eu fazia resenhas. Era ela que me incomodava, tomava meu tempo e me atormentava tanto que no fim matei essa mulher.” (p. 11)
O que ela diz é que nós, mulheres, sem querer, nos colocamos na posição típica da mulher vista por olhos patriarcais: devemos ser meigas, delicadas, educadas, saber agradar e não dar nossa verdadeira opinião, pois afinal, não possuímos. Então, cada vez que ela pegava o papel para escrever, essa mulher, esse “anjo do lar” aparecia para brecar o seu raciocínio, como se fosse um espaço proibido para ela. Proibido para quem? E é isso que nós mulheres, em todas as profissões, classes, religião, país, devemos buscar. Não é tarefa fácil, eu, devota de Virginia Woolf, ainda não consegui matar o meu Anjo Do Lar totalmente, mas estou no caminho.
Mulheres trabalhadoras
Virginia Woolf caiu no gosto das mulheres de sua época e por isso ela também foi convidada para escrever a introdução do livro “A vida como conhecemos”, escrito por mulheres de uma cooperativa de trabalhadoras. É lindo de ler, ao final, você quer levantar da poltrona, colocar o livro cuidadosamente sobre ela e aplaudir.
O nome do prefácio é “Memórias de uma União das Trabalhadoras” e a sensação é que ela está simplesmente conversando com o leitor sobre a união das mulheres, as oportunidades de educação e cultura, os estímulos sociais de cada um, querendo que ele entenda o quanto a vida surpreende – para melhor e pior – mais que a literatura, ao mesmo tempo o quanto é importante a liberdade das mulheres, num sentido mais profundo que a vida e a arte.