Virginia Woolf é sempre lembrada como uma escritora difícil que, por utilizar a técnica do fluxo de consciência, deixa os curiosos em ler sua obra com um certo receio. Mas, por minha própria experiência, posso afirmar que é muito válido encarar o desafio de ler Virginia Woolf, pois, quando o fluxo de consciência é compreendido, o leitor saberá da potência artística da autora. É realmente de uma beleza ímpar. Assim, para a sorte das crianças e jovens leitores, Virginia Woolf também produziu contos e romances utilizando as técnicas narrativas de uma forma mais comum, com ações mais ligadas à vida externa que a interior, por meio de histórias lineares.
O conto “A viúva e o papagaio” foi escrito para um jornal que os sobrinhos da autora produziram na década de 1920. Depois, também foi publicado em um jornal literário da época e em 1988, Julian Bell, seu sobrinho, fez uma edição ilustrada do conto.
Hoje em dia, há uma versão do conto em ebook e, com um pouco de sorte, é possível encontrar o conto em sebos. A versão comentada aqui é referente ao livro “Contos Completos“, da extinta CosacNaify, com tradução de Leonardo Fróes.
Atualização: em julho de 2022, a editora Nversinhos lançou uma versão da obra:
Lembranças iniciais
O início do conto, me lembrou um pouco “A festa de Babbet”, de Karen Blixen, pois, da mesma maneira, é o destino que lança sua primeira carta rumo à uma transformação na vida, no cotidiano e também no oculto. A viúva, que vivia em condições muito simples, descobre que o seu irmão (um homem avarento) morreu e lhe deixou uma pequena fortuna. Com a chance de mudar de vida, a mulher vai até outra cidade para buscar o seu dinheiro, porém, um balde de água fria é jogado em seu entusiasmo e, de repente, ela percebe que apenas tem como herança o papagaio de seu irmão.
“Há mais sentido nos atos dessa criatura do que nós humanos sabemos.”
A simplicidade
A beleza do conto mora na simplicidade da narrativa. De forma linear, Virginia Woolf vai tecendo a história, mostrando traços da vida da viúva, seus vizinhos, a paisagem bucólica de Lewes (local de sua própria casa – Monk’s House) e a vida com suas questões burocráticas.
Mrs. Gage, a viúva, percorre um pequeno caminho, porém, passa por situações um pouco perigosas e divertidas. De repente, ela percebe que tem apenas o papagaio como herança. Porém, após o incêndio de sua casa, é o próprio papagaio que a livra de sua delicada situação e também demonstra carinho por ela, como um dia demonstrou ao seu irmão.
Finais felizes não é uma prática constante na obra de Virginia Woolf, porém, nesta história para jovens leitores (o livro é indicado para leitura no 5º ano do ensino fundamental) é possível perceber, além de seu domínio para construir a história, a beleza dos contos que tanto encantam crianças por meio de lições de coragem, fé e respeito aos animais.