O dia em que conheci Brilhante Ustra (Alex Solnik): os horrores de testemunhar violências

Descubra os horrores da ditadura através das memórias de Alex Solnik no livro O dia em que conheci Brilhante Ustra. Um relato impactante sobre um dos períodos mais sombrios da história brasileira.

O dia em que conheci Brilhante Ustra, de Alex Solnik (Ed. Geração, 160 p., 2024, impresso R$ 59,90, e-book R$ 38,90), relata a prisão do autor, no dia 4 de setembro de 1973, seu encarceramento por 45 dias e sua soltura, sem nenhuma explicação, depois desse período em que viveu os horrores de testemunhar violências e torturas contra presos políticos.

O Brasil vivia uma ditadura militar, com enfrentamento entre grupos de luta armada e o governo, que recorreu à repressão, inclusive por grupos clandestinos, prisões ilegais, tortura e morte de pessoas, muitas delas inocentes.

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Foi o caso de Alexandre Solnik: foi confundido com um militante de um desses grupos e preso. Ele relata sua rotina na prisão, em um diário, dia após dia. Fala de sua convivência com um colega de cela que é barbaramente torturado, quase todos os dias. Descreve seus medos, terrores e sensações. Relembra fatos de sua vida e dos membros de sua família, imigrantes ucranianos.

Relatos pungentes

O relato é muito pungente. No entanto, apesar de toda a violência, há pequenos respiros no texto, entremeados por brevíssimos e inusitados trechos de humor, digressões e poesia. Esses elementos emprestam ao texto uma beleza única, sobretudo quando são amargos, tristes ou desesperados. Além disso, as digressões são marcantes e não abandonam a narrativa corrente, criando espaços que podem fazer uma curva ou outra, sem nunca desviar do caminho principal.

O relato em primeira pessoa dá uma vida extraordinária ao livro, mesmo quando os fatos não são vividos pelo narrador, mas por seu companheiro de cela. Quem espera uma narrativa linear se engana. A narrativa ganha tons de diário jornalístico ao relatar os fatos ocorridos no Chile – que viveu um golpe enquanto Solnik estava preso – acompanhados pelos jornais com os quais a mãe inteligentemente embrulhava as refeições.

Além disso, há momentos de diálogo direto com o leitor, um convite a participar mais intensamente do livro. Toda a narrativa é construída como se estivesse compartilhando diretamente a experiência do autor. Este trecho em particular nos “puxa” para dentro da história, usando a forma para nos levar a experimentar, de maneira profunda e comovente, o conteúdo.

Humano e bestial

As cenas de tortura do companheiro de cela alcançam o auge da bestialidade. Nessa parte, o relato real termina de forma extremamente eloquente, como se a pessoa torturada não fosse ninguém, nada. Além disso, a descrição psicológica dos carcereiros e torturadores impressiona. A narrativa leva o leitor para os porões da ditadura. Brilhante Ustra, por exemplo, não é tratado como um monstro. Como escreveu o Cardeal Dom Evaristo Arns no prefácio de Brasil Nunca Mais, o torturador pode ser aquele que passa a mão na cabeça do filho do vizinho na rua. Isso confere um caráter humano às entranhas sombrias que podem habitar uma pessoa imbuída de poder quase absoluto sobre outra.

Portanto, é fundamental manter atenção constante e completa sobre os meandros da natureza humana e como ela pode se manifestar de forma infame quando o contexto permite. O livro é bem-vindo para que essa lembrança permaneça uma cicatriz visível e latente em nossa memória.

Sobre Alex Solnik

Alex Solnik nasceu em Drohobytch, Ucrânia, em 1949. Chegou ao Brasil em 1958. Jornalista profissional desde 1974. Assinou centenas de reportagens nos principais jornais e revistas do país e escreveu vários livros, dentre os quais “O Cofre do Adhemar”, “A última batalha de Napoleão”, “A ilha socialista de D. Pedro II” e a peça de teatro “O casamento do Pau-Brasil com a foice e o martelo”.

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