“Ainda assim, o sol aquecia. Ainda assim, superavam-se os golpes. Ainda assim, a vida tinha o dom de fazer um dia se seguir ao outro.”
p. 66
Peter Walsh, depois de visitar Clarissa Dalloway, passeia pelas ruas de Londres e fica apaixonado por uma moça morena. Isso mostra, num primeiro momento, o quanto as suas vontades e desejos não são claros, pois quando conversa com Mrs Dalloway, ele afirma que estava apaixonado por uma mulher que ele conheceu na Índia. E a confusão continua: enquanto passeia por Londres e pensa sobre sua relação com Clarissa, ele acha que está apaixonado por Clarissa. Que homem confuso!
E ele se aproxima do casal maluco Septimus e Rezia, considera os dois estranhos, senta num banco da praça e adormece.
No sonho temos a figura do “caminhante solitário”, como um homem que caminha em busca de algo que nem mesmo ele sabe, que pode ser entendido como uma fuga, um escudo para não enxergar a tragédia que lhe aconteceu. Porém, toda essa busca (as paixões repentinas) revelam a sua tentativa de aprender, de escapar de uma vida solitária. Em vão.
Em Mrs Dalloway o sol aquecia
O passeio de Peter Walsh aproxima muito o leitor do personagem. A princípio, pensamos uma coisa, ao final outra. É como conhecer uma pessoa, ter uma primeira impressão ruim e depois perceber o engano, por meio da certeza de estar perto de uma pessoa interessantíssima. E isso não acontece apenas com Peter, porque em Mrs Dalloway o sol aquecia e os outros personagens também causam essas impressões complexas, que vão mudando, a medida que viramos a página.
Lucrezia, que a princípio parecia apenas preocupada com as aparências, com a imagem de louco que o seu marido revelava, mostra a partir da página 66, uma enorme tristeza pela vida que ela leva, por ter abandonado a sua cidade natal (Milão) para viver em Londres, uma cidade que ela não gosta, com um marido que vive numa outra realidade.
Levemente embaralhados pelas lágrimas, a alameda, a ama, o homem cinza, o carrinho de bebê subiam e desciam diante de seus olhos. Ser empurrada para lá e para cá por esse perverso torturador, essa era a sua sina. Mas por quê? Ela era como um pássaro, abrigado sob a tênue concavidade de uma folha, que pisca os olhos frente à luz do sol quando a folha se mexe; que se sobressalta frente ao estalido de um graveto seco. Estava desprotegida; estava cercada pelas enormes árvores, pelas vastas nuvens de um mundo indiferente, desprotegida; torturada; e por que deveria ela sofrer? Por quê? (p. 67)
Por fim, estou na página 100, a narração continua intercalando o personagem Peter e o casal Smith. A grande pergunta do momento é: de que forma a loucura de Septimus se mistura à rotina de Mrs Dalloway?
Confira todas as publicações do Diário de Leitura Mrs. Dalloway:
- Mrs. Dalloway #1 As flores
- Mrs. Dalloway #2 Que tolos somos
- Mrs. Dalloway #3 Viver é muito perigoso
- Mrs. Dalloway #4 Falando em grego
- Mrs. Dalloway #5 Ainda assim o sol aquecia
- Mrs. Dalloway #6 O tempo
- Mrs. Daloway #7 Eu te amo
- Mrs. Dalloway #8 O beijo, o amor e a vida