Um livro negro é um conjunto de informações sobre o outro lado da moeda de algum assunto. Como por exemplo, o livro negro da pediatria, onde há relatos de situações cabulosas envolvendo o tema. No caso deste post, O livro negro, do laureado pelo Prêmio Nobel, Orhan Pamuk, fala sobre os bastidores de um escritor famoso de Istambul.
O narrador e personagem principal é Galip, homônimo de um famoso escritor antigo que constantemente é citado nas epígrafes de cada capítulo do livro. Os capítulos são intercalados, ora uma narração de Galip ora uma crônica de seu primo (o escritor acima mencionado) Celâl. A história apenas tem seu fluxo propriamente dito nos capítulos de Galip; já os das crônicas que Celâl publica num jornal, que o elevou a figura icônica do país, ajudam a nos ambientar com a família que estrutura a trama.
Uma busca silenciosa
O primeiro capítulo nos coloca a parte do desaparecimento da esposa de Galip, Rüya, que significa “sonho”. Rüya é uma devoradora de romances policiais baratos, que compra aos montes, espécie de suprimentos para determinado espaço de tempo; há também os pistaches, seu outro vício. A partir desse capítulo, Galip se lança numa busca silenciosa e solitária atrás de sua esposa, sem contatar a polícia ou parentes.
Celâl, o escritor, começou com pequenos artigos em algum jornal até alcançar a imensa fama com suas crônicas diárias no jornal de nome Milliyet (nome que acho fantástico). Quando era pequeno, seu pai viajou até o continente europeu, e depois de alguns anos, ninguém acreditou que voltaria. Quando voltou, trouxe uma nova esposa — já que a deixada se cansou de esperar e arrumou também uma outra vida – que tinha uma filha de um outro casamento, tornando-se a meia-irmã de Celâl, Rüya, com a qual Galip se casou.
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Muitas das crônicas do escritor são a respeito de sua enorme família, que foi morrendo e sofrendo cisões à medida que crescia. No começo todo viviam num mesmo prédio, onde eram prósperos, unidos e permeados por festas. Na época em que a história se passa, os prédio já não se encontra na posse da família, e os pitorescos episódios descritos nas crônicas já não podem mais ser presenciados. Alguns parentes não gostavam de Celâl por desnudar a vida privada da família, e muitos de seus inimigos diziam o mesmo. Após a fama, Celâl Salik se tornou um recluso, ninguém conhecia nenhum de seus inúmeros endereços, nem mesmo sua família ou colegas de trabalho o que contribuía para seu título de “lenda viva”.
Galip abandona por um período seu emprego de advogado enquanto procura por Rüya. No começo acha que ela voltou para o ex-marido, mas após uma visita a ele numa noite com muita neve e pessoas estranhas pela rua, descobre que este se encontra satisfeito com uma nova família. É então que se dá conta que Rüya está com seu adorado meio-irmão Celâl.
Os episódios de divagações introspectivas
Assim como há os intervalos entre os capítulos de Galip e as crônicas publicadas por Celâl, existem também os episódios de divagações introspectivas, comumente associadas às crônicas. Um dos temas principais é sobre a essência de cada ser. Se ele é quem é, ou quem deseja ser. E se na estrada de se tornar ele se perde de si mesmo. E quem é esse “si mesmo”.
Porém, o diamante a ser lapidado durante o livro é a transformação de Galip durante sua procura por Rüya. Sua transformação em Celâl, ao ler tudo que ele produziu, ao se passar por ele em busca de sua mulher.
Por fim, o desenlace pode não ser tão satisfatório em termos de livros de mistério. Mas a incógnita sobre personalidade debatida na obra ainda não possui seu desenlace em qualquer instância.
Respostas de 4
Gostei da premissa! Já leu “Neve”? Ele está na minha listinha de “vou ler”.
Eu peguei emprestado. Três. Esse da resenha, Meu Nome é Vermelho, e Neve.
Gostei muito de Neve. Achei a escrita cativante e o final surpreendente. Foi meu primeiro contato com uma narrativa sobre a Turquia, formou, para mim, um imaginário sobre o oriente próximo, a religião, a tolerância com o diferente e o quanto a visão europeia atual interfere no nosso olhar sobre as culturas alheias.
HAHAHAHAHAHA Menina, acredita que aconteceu a mesma coisa comigo com O Livro Negro?