Ler Juan Pablo Villalobos é uma experiência diferente, sempre. De algum jeito que só a arte explica, o autor mostra um mundo totalmente louco, mas também muito real, com personagens interessantes, que causam muita empatia. No livro Se vivêssemos em um lugar normal, vamos conhecer uma família que cria uma metáfora com o próprio alimento, as quesadillas, prato típico mexicano, de acordo com a situação econômica. Se há dinheiro, há muitas quesadillas. Se falta dinheiro em casa, as quesadillas são pequenas e com pouco recheio. “Quesadillas de pobre”, “Quesadillas inflacionárias”, “Quesadillas Impossíveis”, entre outros nomes, aparecem como único cardápio e, assim, de um jeito bem-humorado e trágico, é possível conhecer um pouco da realidade de uma família mexicana que vive à margem.
“As quesadillas normais eram as que comeríamos todos os dias se vivêssemos num país normal, mas se fôssemos um país normal não comeríamos quesadillas, portanto também as chamávamos de quesadillas impossíveis” (p. 10)
Orestes é o narrador da história. Ele conta a história de sua família e as mudanças que aconteceram por conta de questões políticas e sociais que ocorreram no México nos anos 80, período em que a inflação estava totalmente descontrolada. Famintos, com a casa inacabada, localizada num lugar longe da cidade, “o Morro da Puta Que Pariu”, vizinhos ricos aparecem, alguns filhos desaparecem e uma solidão e incompreensão da vida permeia a obra, de forma a transformar Orestes em um garoto que tenta ver além de sua realidade, mas que precisa enfrentar o seu difícil cotidiano, para ter uma vida possível.
No início da história, dois irmãos de Orestes, Arquíloco e Calímaco, desaparecem enquanto a família está no mercado. Ele, que aos poucos percebe o quanto é gigante o sofrimento de seus pais por conta deste desaparecimento, se junta ao irmão mais velho para tentar encontrar os dois irmãos. Mas entre ele e Aristóteles (o irmão mais velho) há muitas diferenças sobre o motivo do desaparecimento dos irmãos e assim, o drama familiar aumenta, na mesma proporção que os garotos compreendem que são eles que deverão resolver o problema.
A queda de uma família
A história de “Se vivêssemos em um lugar normal” pode ser vista como o desmoronamento de uma família, mas também como uma saga, que oscila entre uma classe social e outra, e emociona porque os sentimentos dos personagens são verdadeiros até mesmo nos momentos absurdos (temos alienígenas e controles remotos mágicos).
Se o que leva um povo para outro lugar é algo alienígena ou não, o fato é que não sabemos mesmo o que o futuro reserva e que é muito importante viver a vida, encarar a realidade dura, difícil, que transforma cada vez mais ingenuidade em frieza e revolta, mas também em ação.
“Naquela época, eu achava, entre outras coisas, que todas as pessoas e as coisas que apareciam na televisão não tinham nada a ver com a gente e com a nossa cidadezinha, que as cenas da telinha aconteciam em outro nível da realidade, numa realidade emocionante que nunca tocava nem tocaria nossa entediada existência” (p. 8)
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