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Kew Gardens (Virginia Woolf): um jardim como personagem

“A brisa então soprou ligeiramente mais forte e a cor, sendo esbatida para cima, desapareceu pelo ar, pelos olhos dos homens e mulheres, que andavam em julho por Kew Gardens” (p. 115)

Londres, a cidade preferida de Virginia Woolf, possui diversos jardins. Entre tantos, Kew Gardens foi utilizado pela autora como cenário e personagem de um conto. Desde o verde da grama com as árvores frutíferas e descrições detalhadas de belas flores, a uma conexão, suave como uma brisa, das pessoas que decidem passear por um jardim.

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Após ler o conto Kew Gardens, um jardim pode se tornar algo diferente para você, leitor, pois ficará evidente a beleza do ser humano quando ele entra em contato com a natureza, mesmo que por alguns minutos, mesmo que ele não tenha total consciência desse contato.

É sobre a natureza

kew-gardens
Camille Pissaro, Kew Greens, 1892

Despretensioso como tocar numa flor com delicadeza apenas para sentir a sua textura, Kew Gardens não é um conto sobre pessoas, mas sim sobre a natureza e o pequeno contato que seres humanos ainda possuem com flores, árvores e um belo jardim. Assim, alguns personagens passam pelo jardim que, como configura a força da natureza, deixa-os inertes em si mesmos, pois todos ali, de formas diferentes, acabam utilizando o momento para refletir sobre a vida, em pequenas lembranças boas ou ruins.

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O primeiro casal que o leitor irá encontrar, passeando pelo canteiro de flores, é Simon e Eleanor. Ele tem o seu pensamento no passado, quando naquele mesmo lugar, pediu uma mulher em casamento, mas ela disse não. O seu desejo de compartilhar o momento, o faz perguntar à sua esposa se ela se incomoda em saber sobre o que ele pensava:

“Mas por que importaria, Simon? Não pensamos todos nós no passado, num jardim com homens e mulheres sob as árvores? Não são eles o nosso próprio passado, tudo o que resta dele, esses homens e mulheres, esses fantasmas que jazem sob as árvores… nossa felicidade, nossa realidade?” (p. 116)

No caso dela, Eleanor, bem humorada mas consciente do que sentiu no passado, lembra-se que lá ganhou o primeiro beijo na nuca, de uma mulher velha, “com uma verruga no nariz, a mãe de todos os meus beijos na vida.” (p. 117)

Os significados

Em seguida, porque os filhos do casal precisavam de atenção, o leitor irá conhecer outros personagens, também por poucos minutos em suas vidas, porém, carregados de significações ou significados. É poderosa linguagem de Virginia Woolf que, com poucas palavras, parece desvendar lugares misteriosos e profundos do ser humano.

Há dois homens passeando pelo canteiro de flores. Um dá a impressão de cuidar do outro, porque este afirma conversar com espíritos, que “neste exato momento lhe contavam as mais variadas e estranhas coisas sobre suas experiências no céu” (p. 118). Um deles, que controla o amigo louco, chama-se William, o outro não sabemos. É ele que segura o amigo quando avista, ao longe um vestido de mulher, que o faz caminhar na direção, com o coração apertado. Se um espírito, algo real ou irreal, fica a critério das referências de cada leitor descobrir.

Diálogos difíceis

Vamos conhecer também duas senhoras que acompanhavam, à distância, os gestos loucos do amigo de William, elas, intrigadas se aquilo era loucura ou excentricidade, também não demonstram muita normalidade ao conversarem por diálogos difíceis de compreender, mas admiram as flores como qualquer visitante de um belo jardim.

Em seguida, temos dois jovens, um homem e uma mulher, que brincam de enfiar a ponta da sombrinha na terra do jardim, mas também estão preocupados com o preço do chá servido em Kew Gardens.

Uma câmera em movimento

Percebemos então, que tudo acontece como se uma câmera sem movimento detectasse as pessoas que passavam pela lente direcionada ao canteiro de flores. Kew Gardens é um jardim enorme, como também é a complexidade dos seres humanos e da natureza.

Não podemos esquecer do caramujo que faz parte da história. A sua dificuldade em contornar uma simples folha, o medo de que o seu peso não aguente, parece ser algo que também faz parte das pequenas angústias, dos personagens que conhecemos tão pouco, mas que nutriam ali também um medo de contornar as coisas.

O barulho da cidade

Ora o passado, ora um beijo, ora um espírito, ora a velhice, ora o desejo de tomar um chá. A vida cotidiana e a natureza, sempre conectadas, às vezes, em um belo jardim, mas também em outros lugares, qualquer lugar, porque, sempre que uma pessoa faz um pequeno gesto em seu dia-a-dia, há também um caramujo, tentando se equilibrar na vida. E lá fora (do jardim) a cidade vive em seu barulho urbano.

Por fim, temos as cores da natureza, que se misturam às pessoas, como se o conto fosse um quadro impressionista, que nos dá também a sensação do silêncio, mas também das vozes que conversam no jardim, das crianças que brincam e do contentamento que chega a causar um silêncio gostoso na alma, apesar do barulho constante, como se tudo ali fosse uma única coisa.

“Assim um casal depois do outro passava pelo canteiro de flores, com muito da mesma movimentação irregular e sem objetivo, e era envolvido em camada de vapor verde-azulado, no qual a princípio seus corpos tinham substância e um pouco de cor, embora cor e substância se dissolvessem mais tarde na atmosfera verde-azulada.” (p. 121)

Veja o vídeo sobre o conto Kew Gardens no canal Livro&Café:

Referências: Virginia Woolf, Contos Completos, tradução de Leornardo Fróes, CosacNaify

Onde comprar livros com o conto Kew Gardens: Amazon

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