Confesso que antes de ler o conto, imaginei que encontraria fortes diálogos de mulheres questionando suas próprias existências em universidades, coisa que não acontecia na época em que Virginia Woolf escreveu o conto*. Imaginei algo intenso em ações como o conto Uma Sociedade, mas como Woolf sempre me engana e eu adoro, Uma escola de mulheres vista de fora é um lampejo secreto e sem nome.
Talvez, seja por conta desses lampejos secretos e sem nome que muitas vezes comparam Virginia Woolf com Clarice Lispector, pois a escritora brasileira também colocou seus personagens nesse conflito interno de nomear momentos tão efêmeros e profundos da vida. Porém, acredito que a forma como as autoras caminham para esse fim são muito diferentes, portanto, qualquer comparação entre as duas, considero tola.
Sobre a personagem central
Angela Williams é a personagem central do conto Uma escola de mulheres vista de fora. Ela está deitada em seu quarto à espera do sono que não vem. Há outras mulheres no quarto coletivo da universidade, cada qual, enfrentando sua noite escura. Angela, ainda lida com o seu reflexo no espelho.
“Pois o espelho apresentava uma imagem que era incapaz de tremer – branca e dourada, chinelos vermelhos, cabelo claro com pedrinhas azuis, e nunca uma ruga ou sombra para interromper o prolongado beijo de Angela e seu reflexo no espelho, como se ela estivesse radiosa de ser Angela. Radioso, fosse como fosse, era o momento – o quadro reluzente pendurado no coração da noite, o santuário escavado nas trevas”.
(Uma escola de mulheres vista de fora, p, 201, Contos Completos, tradução de Leonardo Fróes)
Os detalhes da natureza
Sabemos sobre os outros quartos e suas moradoras pela descrição de seus nomes em cartões pendurados em suas portas. Assim, há um frieza, mas bonita e melancólica por conta do luar lá fora e sua descrição tão perfeitamente elaborada por Virginia Woolf. Cada vez percebo mais esse gosto da autora em detalhar a natureza, pois fica tão evidente o quanto o ambiente externo acaba transformando as situações internas e, consequentemente, atingindo as emoções das personagens.
Angela, em certo momento, parece alcançar um tipo de conforto pela própria vida que leva – e sabemos tão pouco sobre a sua própria vida. Por outro lado, mesmo com a bela paisagem e a sua vida sem grandes conflitos, ela não consegue dormir.
“(…) após a negra turbulência de uma infinidade de épocas aqui estava a luz do fim do túnel; a vida; o mundo. Embaixo dela – tudo ótimo; tudo adorável. Tal foi sua descoberta.”
(p. 204)
Uma escola de mulheres vista de fora: uma crítica?
Por fim, algumas perguntas permanecem: Virginia Woolf viveu em uma época em que mulheres não ia às universidades, não seria esse conto uma crítica a algo que ela – como escritora – só podia ver de fora? O nome Angela e os outros cartões na porta dos quartos não seriam apenas a imaginação de todas as mulheres que desejavam o acesso à universidade?
Um lampejo secreto e sem nome pode ser esse impulso que fez tantas coisas mudarem para as mulheres nas últimas épocas, mas enquanto tudo não for absolutamente igual em direitos, gritos e dores serão sentido por todas aquelas que não querem ver as coisas apenas de fora, querem participar do mundo. Eu quero.
“Todas a janelas abertas, com um azul afogueado, com algo murmurando ao longe o mundo, é claro, e a manhã chegando, “Oh”, gritou ela, como se sentisse uma dor.” (p. 205)
*publicado em 1926 e que faria parte do romance O quarto de Jacob, porém, a autora decidiu não incluir.
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