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Como entender a linguagem do Modernismo?

Quando falamos das Escolas Literárias apenas em relação aos seus principais autores e contexto histórico, deixamos de lado algo tão importante…. que mora na seguinte pergunta: como entender a linguagem do Modernismo?

Sabemos que nossas Escolas Literárias acompanham, de algum modo, as tendências europeias. Portanto, falar sobre a linguagem do Modernismo no Brasil é também falar de algumas outras vertentes que fizeram sucesso na Europa, como o Cubismo e o Futurismo. Portanto, abaixo você vai conhecer dois poemas franceses que muito contribuíram para a construção da linguagem do Modernismo.

Leia também: Modernismo no Brasil: como tudo começou?

Um poema francês

A linguagem do Modernismo
A LINGUAGEM DO MODERNISMO EM TODAS AS ARTES: Para escrever o poema “As janelas”, Apollinaire se inspirou  em uma das obras da série também chamada “As Janelas”, do pintor cubista Delaunay.

O poema “As janelas” de Guillaume Apollinaire, representante do Cubismo francês, é sobre possibilidades. Janelas reais e simbólicas abrem à nossa frente na mesma proporção que a cidade acontece; na mesma proporção que o irreal (aves voando em uma asa só…em dupla?) nos mostra que o século XX está disposto a caminhar em direção a outros temas, formas, ideias… Temos aqui, então, um poema que diz muito sobre a linguagem do Modernismo: 

  • a simultaneidade de imagens
  • a fragmentação da realidade
  • como se uma câmera fotográfica estivesse soltando flashes

As janelas

Do vermelho ao verde todo amarelo morre
Quando cantam as araras nas florestas natais
Cavalos-de-frisa de pihis
Aves chinesas de uma asa só voando em dupla
É preciso um poema sobre isso
Enviaremos mensagem telefônica
Traumatismo gigante
Faz escorrer os olhos
Garota bonita entre jovens turinenses
O moço pobre se assoava na gravata branca
Você vai erguer a cortina
E agora veja a janela se abre
Aranhas quando as mãos teciam a luz
Beleza palidez insondáveis violetas
Tentaremos em vão ter algum descanso
Vamos começar à meia-noite
Quando se tem tempo tem-se a liberdade
Marisco Lampreia múltiplos
Sóis e o Ouriço do crepúsculo
Um velho par de sapatos amarelos diante da janela
Tours
A Torres são as ruas
Poços / Depois
São praças lugares
Depois / Poços
Árvores ocas que abrigam alcaparras vagabundas
Os Chabinos cantam árias de morte
Às Chabinas fugitivas
E a gansa uá-uá trombeta ao norte
Onde os caçadores de roedores
Raspam as pelúcias
Faiscante diamante
Vancouver
Onde o trem branco de neve e fogos noturnos fogem do inverno
Ó Paris
Do vermelho ao verde todo jovem perece
Paris Vancouver Hyères Maintenon Nova York e as Antilhas
A janela se abre como uma laranja
O belo fruto da luz

[Fonte: Antologia de poemas com notas e comentário de Décio Pignatari, São Paulo, Companhia das Letras, 1997. p.109-110]

Um poema sobre São Paulo

A linguagem do Modernismo
A LINGUAGEM DO MODERNISMO EM TODAS AS ARTES: Tarsila do Amaral produziu a obra “São Paulo” em 1924. Ela foi amiga de Blaise Cendrars. O quadro foi pintado na mesma época em que o o poeta (um pouco francês e um pouco suíço) esteve aqui.

O poema As Janelas é sobre Paris, revelada de forma fragmentada ao mesmo tempo que toda a sua unidade representa a efervescência de uma grande cidade. O mesmo podemos observar no poema “São Paulo”, de Blaise Cendrars, um poeta que visitou o Brasil e influenciou os artistas da época.

O poema São Paulo, além de exaltar as qualidade da cidade sem preconceito, onde há espaço para todos (Cendrars estaria com vergonha de nossos tempos…) mostra o crescimento da cidade em relação à estética urbana e também o desejo de alinhar-se com as tendências da época. Mil prédios, mil casas, todos diferentes… e por fim, as casas no estilo de Portugal que ficam apagadas, assim como o desprendimento político e cultural do Brasil com Portugal. Assim, podemos destacar outros elementos sobre a linguagem do Modernismo:

  • Surpresas, quebras, rupturas (além da estrutura poética tradicional, pois também se faz presente em seu conteúdo)
  • O sentido de liberdade
  • O ritmo acelerado – mais fácil de ser percebido nos versos longos sem o uso das pontuações tradicionais, que evidencia também o ritmo das cidades

São Paulo

Adoro esta cidade
São Paulo do meu coração
Aqui nenhuma tradição
Nenhum preconceito
Nem antigo nem moderno
Só contam este apetite furioso esta confiança absoluta este otimismo esta audácia este trabalho este labor esta especulação que fazem construir dez casas por hora de todos os estilos ridículos grotescos belos grandes pequenos
norte sul egípcio ianque cubista
Sem outra preocupação que a de seguir as estatísticas prever o futuro o conforto a utilidade a mais-valia e atrair uma grande imigração
Todos os países
Todos os povos
Amo isso
As duas três velhas casas portuguesas que sobram são faianças azuis

[Poema original, em francês: Saint-Paul]

Portanto, é possível entender a linguagem do Modernismo como uma renovação que, ao mesmo tempo, mostrando-se livre e desfragmentada, possuía esse desejo (que foi realizado) em comum a todas as suas vertentes, de se alinhar com a vida comum, a cidade, as pessoas, a velocidade e o ritmo da vida, que tanto modificaram o século XX. A partir das grandes transformações no modo de trabalho e também na forma de compreender as liberdades e culturas de cada um.

DICA DE LEITURA para compreender mais a linguagem do Modernismo:

Blaise Cendrars no Brasil e os modernistas

Sobre a obra: Nesta nova edição, revista e ampliada, a historiadora e crítica de arte Aracy Amaral examina detalhadamente; e de forma pioneira; as relações do poeta suíço-francês Blaise Cendrars com os modernistas no Brasil. O livro aborda, entre outros fatos, o encontro de Cendrars com o grupo brasileiro em 1923, em Paris, a vinda do poeta ao Brasil no ano seguinte e as marcas que essa visita causou tanto em Cendrars como em Mário, Oswald de Andrade, Tarsila, Paulo Prado e outros. COMPRE NA AMAZON

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