Virginia Woolf escreveu Orlando em apenas seis meses. Começou a escrevê-lo no dia 9 de outubro de 1927, terminando o primeiro rascunho na terceira semana de março de 1928. Após vinte dias de férias na França, começou o árduo trabalho de revisão. A primeira versão datilografada estava pronta no final de maio. A ideia para o romance parece ter-lhe ocorrido por volta de 5 de outubro de 1927: “E, de repente, os mecanismos estimuladores de sempre tomam conta da minha mente: uma biografia começando no ano 1.500 & continuando até os dias de hoje, com o título Orlando: Vita; e com uma mudança, de um sexo para o outro. Acho que, para me divertir, vou me deixar envolver por isso durante uma semana” (Diários, 5 de outubro de 1927).

Menos de uma semana depois, no dia 9 de outubro, ela já estava trabalhando no novo livro. Mas precisa ter o consentimento de Vita Sackville-West, a inspiradora de Orlando, antes de usá-la como modelo: “Não conseguia extrair uma palavra de mim mesma [para uma coletânea de ensaios]; e, finalmente, baixei a cabeça, mergulhei a pena no tinteiro e escrevi estas palavras, como que automaticamente, numa folha em branco: Orlando: Uma biografia. Assim que fiz isso, meu corpo foi tomado por uma sensação de arrebatamento e meu cérebro por ideias. Suponha que Orlando acabe por ser Vita; e é tudo sobre você e os desejos de sua carne e o feitiço de sua mente. Você se importaria? Diga sim ou não. E também, como lhe disse, de repente ocorreu-me que posso revolucionar a biografia numa única noite e, assim, se a ideia lhe agrada, gostaria de jogá-la para o ar para ver o que acontece” (carta a Vita, 9 de outubro de 1927).

Ao começar a escrita de Orlando, Virginia esperava terminar o livro até o Natal. Mas em 11 de fevereiro do ano seguinte, ela ainda estava patinando no último capítulo: “Por alguma razão, fico remexendo sem muita atenção no último capítulo de Orlando, que era para ser o melhor. Sempre, sempre, o último capítulo me foge das mãos” (Diários, 11 de fevereiro de 1928). Uma semana depois, o último capítulo é ainda um problema: “A mente é o mais caprichoso dos insetos – esvoaçando, volteando. Pensava escrever as mais ágeis e brilhantes páginas de Orlando ontem – não saiu uma gota, tudo, na verdade, pelas razões físicas de sempre” (Diários, 18 de fevereiro de 1928).

Um mês depois ela podia dizer, aliviada, que tinha posto um ponto final no livro: “Só escrevo agora para dizer que Orlando foi concluído ontem quando o relógio assinalava 1 hora da tarde. Serão necessários três meses de trabalho sério, obrigatoriamente, antes que possa ser levado à impressão. Mas é uma sensação serena, de trabalho cumprido, poder escrever, ainda que provisoriamente, Fim.” (Diários, 18 de março de 1928).

Um dia antes da publicação, em 10 de outubro de 1928, Virginia enviou um exemplar especialmente encadernado de Orlando para a inspiradora do livro (dois meses depois, em 6 de dezembro, Virginia presentearia Vita com o manuscrito). No dia seguinte, Vita, desfazendo todos os temores de Virginia, escrevia, ainda sem ter terminado de ler o romance, cheia de amor e admiração: “Por enquanto não consigo dizer nada a não ser que estou completamente deslumbrada, extasiada, encantada, enfeitiçada. Parece-me o livro mais adorável, mais inteligente, mais rico que já li na minha vida. Sinto-me como uma daquelas figuras de cera numa vitrina, sobre a qual penduram um casaco bordado de pérolas. É como estar sozinha num quarto escuro com uma arca do tesouro cheia de rubis e pepitas de ouro e brocados. Você inventou uma nova forma de narcisismo e, devo confessar, estou apaixonada por Orlando”. Virginia tinha agora não apenas a aprovação de sua musa, mas também a sua mais absoluta admiração. Orlando teve publicação simultânea na Inglaterra (Hogarth Press) e nos Estados Unidos (Harcourt), no dia 11 de outubro de 1928, a data em que também termina, explicitamente, a ação do romance (última frase do livro).

Tomaz Tadeu

[O texto acima é uma das notas da edição de Orlando: Uma biografia, publicado pela Autêntica Editora, com tradução e notas de Tomaz Tadeu. A imagem, que compõe a capa daquela edição, é uma aquarela da flor “fritilária”, feita em 1915, pelo pintor escocês Charles Rennie Mackintosh]


Texto gentilmente cedido por Tomaz Tadeu e pela Editora Autêntica, para o Livro&Café, como introdução do projeto “Lendo Orlando“, que começará assim que a nova tradução estiver disponível nas principais livrarias. Vamos ler Orlando?

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3 Comentários

  1. Preciso ler algo da Virginia Woolf, me pergunto todos os dias como ainda não li nada dela… Não sei, porém suspeito que ela é o tipo de autora com a qual corro o sério perigo de ter uma empatia automática e decisiva… Chegar a ler seus textos é algo que vai acontecer comigo mais cedo ou mais tarde, o contentamento com essa introdução de “Orlando” só comprova isso.

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