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8 poesias de Carlos Marighella para ler urgente!

O nome Carlos Marighella (1911 – 1969) está em evidência por conta do filme dirigido por Wagner Moura, exibido no Festival de cinema de Berlim. Se não bastasse, vivemos em um momento político delicado, em que discursos de violência se sobressaem à humanidade que ainda nos resta. Marighella, político, guerrilheiro e escritor brasileiro, foi perseguido e torturado pela Ditadura no Brasil, sendo considerado “o inimigo número 1” dos militares que golpearam o Brasil. Outros adjetivos a ele são colocados por diversas mídias e publicações, como terrorista, assaltante, bandido etc. Pensando em tudo que envolve o nome dessa figura histórica, fizemos uma pequena seleção com 8 poesias de Carlos Marighella para ler urgente!

Liberdade

Não ficarei tão só no campo da arte,
e, ânimo firme, sobranceiro e forte,
tudo farei por ti para exaltar-te,
serenamente, alheio à própria sorte.

Para que eu possa um dia contemplar-te
dominadora, em férvido transporte,
direi que és bela e pura em toda parte,
por maior risco em que essa audácia importe.

Queira-te eu tanto, e de tal modo em suma,
que não exista força humana alguma
que esta paixão embriagadora dome.
E que eu por ti, se torturado for,
possa feliz, indiferente à dor,
morrer sorrindo a murmurar teu nome”

Urubu

Pairando pelo espaço onde quer que pressinta
carniça, podridão, matéria decomposta
essa ave original de cor preta retinta
o cheiro da imundice alegremente arrosta.

Vem descendo depois. Já não é uma pinta
escura na amplidão do firmamento exposta.
Vem descendo inda mais, cada vez mais distinta,
até que no terreno o corpo feio encosta.

Desde então principia a ceia horripilante
e belisca a esterqueira e grunhe a cada instante,
sacudindo-se toda, inquieta e assustadiça

Assim como o urubu há no alto muita gente
poderosa a fartar que, entanto, moralmente
só consegue viver à custa de carniça

Rondó da Liberdade

É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.

Há os que têm vocação para escravo,
mas há os escravos que se revoltam contra a escravidão.

Não ficar de joelhos,
que não é racional renunciar a ser livre.
Mesmo os escravos por vocação
devem ser obrigados a ser livres,
quando as algemas forem quebradas.

É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.

O homem deve ser livre…
O amor é que não se detém ante nenhum obstáculo,
e pode mesmo existir quando não se é livre.
E no entanto ele é em si mesmo
a expressão mais elevada do que houver de mais livre
em todas as gamas do humano sentimento.

É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.

Está gostando das poesias de Carlos Marighella? Conheça: 25 Livros Sobre a Ditadura Militar no Brasil

Confraternização

Braços caídos
Não mais as mãos nervosas das tecelãs
tocando os
teares,
pondo emendas no fio
não mais o matraquear dos teares
batendo
num barulho monótono, ensurdecedor
Apenas braços caídos,
As operárias pensando nos filhos
com fome
Depois vieram os soldados,
Fuzis embalados,
Defender a propriedade do dono da
fábrica
Mas também tinham filhos,
Mães, noivas, irmãs
A fome era a mesma nos seus lares
também
E as tecelãs os saudaram chamando-os de irmãos
Agora na fábrica há braços erguidos
Aclamando
E há mãos se apertando

poesias de Carlos Marighella
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O país de uma nota só

Não pretendo nada,
nem flores, louvores, triunfos.
nada de nada.
Somente um protesto,
uma brecha no muro,
e fazer ecoar,
com voz surda que seja,
e sem outro valor,
o que se esconde no peito,
no fundo da alma
de milhões de sufocados.
Algo por onde possa filtrar o pensamento,
a ideia que puseram no cárcere.

A passagem subiu,
o leite acabou,
a criança morreu,
a carne sumiu,
o IPM prendeu,
o DOPS torturou,
o deputado cedeu,
a linha dura vetou,
a censura proibiu,
o governo entregou,
o desemprego cresceu,
a carestia aumentou,
o Nordeste encolheu,
o país resvalou.

Tudo dó,
tudo dó,
tudo dó…
E em todo o país
repercute o tom
de uma nota só…
de uma nota só…

A Vaga

De manso surge a vaga.
Vem de leve de uma ruga do mar que o vento ensaia
impelir e rolar. E rola e em breve
numa auréola de espumas cinge a praia.

E é majestosa e bela quer se eleve
expandindo-se toda ou se contraia,
erga-se em cristas brancas como a neve
ou rebramando escachoante caia.

Tal como a vaga é o meu amor por ti
férvido, impetuoso — o que eu senti
no coração com mais ardor vibrar.

Amor que de meus versos dentre a espuma
borbulha e se agiganta e se avoluma
como a vaga rolando sobre o mar.

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Canto da Terra

A terra tem tudo
e plantando é que dá.

E plantaram e plantaram
ou já estava plantado.
A floresta amazônica,
o rio e os peixes
e o balacubau.

A caatinga existia
com a braúna,
o mandacaru
e o gravatá cariango.
As coxilhas do Sul,
o maciço do Atlântico,
a Serra do Mar,
os pinheiros erguidos,
o rio Amazonas,
o rio São Francisco,
o rio Paraná…

Canaviais assobiando,
cortina verde estendida
sobre imensa extensão.

E plantaram café
e cacau e borracha…
E plantaram erva-mate…

Com o escravo e o imigrante
tudo se fez.
Comidas meu santo,
a mulata, a morena…
e até a loura surgiu.
A índia já havia,
a gringa veio depois.
Quem atrapalhou
foi gente de fora
que não trabalhou.

Eu canto a terra…
Todos sabem que outra
mais garrida não há…
“Teus risonhos, lindos campos têm mais flores”…
Bom! Lírios já houve,
mas agora é que não.

Eu canto a terra,
eu canto o povo…
Cantam os poetas
e cantando vão…

Canto para Atabaque

Ei bum!
Qui bum-rum!
Qui bum-rum!
Bum! Bumba!

Ei lu!
Qui lu-lu!
Qui lu-lu!
Lumumba!

Ei Brasil!
Ei bumba meu-boi!

“Mansu, manseba,
traz a navalheta
pra fazer a barba
deste maganeta.”

Lá vem beberrão,
lá vem Bastião,
tocando bexiga
em tudo que é gente.

O engenheiro medindo,
empata-samba empatando,
cavalo-marinho
dançando, dançando.
O boi requebrando,
o boi ‘stá morrendo,
o boi levantando,,,

Ei Brasil-africano!
Minha avó era nega haussá,
ela veio foi da África,
num navio negreiro.
Meu pai veio foi da Itália,
operário imigrante.
O Brasil é mestiço,
mistura de índio, de negro, de branco.

Bum! Qui bum-rum! Qui bum-rum! Bum-bum!

Quem fez o Brasil
foi trabalho de negro,
de escravo, de escrava,
com banzo, sem banzo,
mas lá na senzala,
o filão do Brasil
veio de lá foi da África.

Ei bum!
Qui bum-rum!
Qui bum-rum!
Bum! Bumba!

Ei lu!
Qui lu-lu!
Qui lu-lu!
Lumumba!

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