É com pesar e lamento, pelo fato de que o livro ainda não foi lançado em Português (pode ser facilmente adquirido em sua versão original pela Amazon), que começo a escrever sobre Not Dead & Not For Sale (2011, Scribner) a autobiografia de Scott Weland, ex-líder do Stone Temple Pilots e Velvet Revolver, encontrado tragicamente morto em um ônibus de turnê em 2015 (o que torna o título do livro ultrapassado).

    Os fins geralmente justificam os meios. De fato Scott Kline, que só se tornou Weilend por meio de seu pai adotivo (o biológico o abandonou aos dois anos), não teve uma vida lá muito fácil. Com uma mãe alcoólatra, perdeu seu meio-irmão em um acidente trágico, atropelado por um carro enquanto andava de bicicleta, ainda criança, e confessa, segundo ele pela primeira vez a não ser quando contou em uma roda de autoajuda em um hospital psiquiátrico, ter sido estuprado por um garoto mais velho uma vez após a escola.

    É por meio de sua narrativa de dor, mas ao mesmo tempo sempre mencionando com muito tato as pessoas que fizeram parte de sua história, que Scott remonta sua vida e trajetória musical, desde a primeira banda, chamada Soi-Disant, até o que veio a se tornar o Stone Temple Pilots cuja a sigla “STP” veio de uma famosa logomarca de óleo para automotores cujo adesivo ele tinha em sua bicicleta, o qual segundo ele, lhe remetia de alguma forma à rebeldia.

    Sobre o Velvet Revolver, um “power group” do início dos anos 2000 formado com ex-membros do Guns N’ Roses , revela ter aceitado se juntar ao grupo à princípio apenas pelo dinheiro e que não gostou do material enviado a ele a pricípio:

    “Parecia rock clássico como o do Bad Company. E eu nunca gostei de Bad Company. Mas sendo um cara legal, eu disse: ‘Há algumas coisas boas, é só me enviar outro disco quando tiverem algumas músicas novas’. Uma semana depois, chegou um outro CD com músicas personalizadas para mim. As músicas eram puro STP [Stone Temple Pilots].” (pág.184 tradução livre)

    O grupo (principalmente Duff Mckagan) foi absolutamente paciente com sua reabilitação quanto às drogas. O grupo parecia se alinhar e se tornou um fenômeno mundial por um curto período. Mas não sobreviveu a novos envolvimentos de Weiland com as drogas, que resultaram inclusive em sua prisão em 2007 (o que não foi a primeira, diga-se de passagem). No mesmo período a perda de seu irmão para a heroína também o desestabilizou profundamente e após o segundo disco a banda sucumbiu. Houve um breve retorno ao STP anos depois mas os problemas continuaram até os dias finais.

    Scott foi rechaçado por sua ex-mulher em uma carta aberta na internet após a sua morte:

    “Vamos fazer dessa a primeira vez em que não vamos glorificar esta tragédia com esse papo de rock and roll e os demônios. Deixe a camiseta com ‘1967 – 2015’ [data de nascimento e de morte do cantor] e use o dinheiro para levar uma criança a um jogo de bola ou para tomar um sorvete”. 

    Segundo Mary, com quem Scott teve dois filhos e foi o grande amor de sua vida, as crianças “já haviam perdido o pai ausente há anos, o que eles realmente perderam no dia 3 de dezembro (data de falecimento) foi a esperança.

    O livro é recheado de fotos, do início ao fim. Intercalando à escrita o torna consideravelmente curto. Mas o que fez com que fosse uma leitura breve para mim, foi sem dúvida a forma como ele te prende. Scott parece ter entregue dolorosamente um pouco de sua alma neste livro, assim como fez em sua música. E mesmo você sabendo o quão errático ele foi em vida, não tem como não se sensibilizar por sua história contada sob a perspectiva de quem calçou os seus sapatos. Uma das melhores biografias que já li.

    A biografia está disponível na Amazon

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    4 Comentários

    1. Fernanda Huguenin on

      Que resenha inesperada! Como fã de Stone Temple Pilots e Weiland foi uma boa surpresa encontrar uma resenha brasileira sobre essa biografia dele. Adorei,pena que não foi traduzida para cá! 🙂

    2. Ótima resenha! Gosto assim, da linguagem informal, da “boa conversa sobre um livro” 🙂 nunca li uma biografia, sempre tive a impressão de que acharia uma leitura chata. Acho que vou dar uma chance esse ano, quem sabe não gosto?

    3. Baita sacanagem não ter essa biografia traduzida para português, porque sou muito fã de STP e, por consequência, do Scott Weiland — baita vocalista e letrista. Só acho que a ex-mulher dele andou falando algumas coisas estranhas, como ele ter se tornado ateu etc., que não podem ser refutadas por ele. Deveria ficar quieta, já que ele não está mais aqui para se defender. Infelizmente as drogas foram determinadas no declínio dele como vocalista. Os primeiros registros do STP, especialmente, davam conta de ser ele um dos melhores vocais, mas depois veio a decadência física, mental etc.

    4. Pois é, Renato! Tem muita biografia boa sobre músicos que carece de tradução para o PT-BR. Mas não sei se você conhece a Editora Belas Letras, mas a equipe tem feito um ótimo trabalho traduzindo livros do gênero. Acho que rola fazer uma sugestão nas redes sociais para eles colocarem o livro no radar, que tal?

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