2666. Roberto Bolãno. A PARTE DOS CRÍTICOS

Só porque eu estava achando a leitura fácil (pois alguns amigos disseram que Bolaño escreve difícil) encalhei da página 29 a 33, por que o escritor decidiu fazer uma digressão nessas páginas onde a única pontuação utilizada é a vírgula. Não fiquei sem fôlego, porque quando o ar falta no meio da frase, considero que a frase está errada. Já dizia Clarice Lispectornão mexa nas minhas vírgulas, é a respiração de minha frase”, ou algo assim. Fiquei mesmo sem rumo, sem norte, o “tico e o teco” falharam e eu tive de ler as 5 páginas duas vezes: à noite, quando os olhos estavam cansados; pela manhã, quando os olhos sentiram o ar do delicioso outono entrando pela janela . Ah, agora sim, entendi. E vamos continuar com a aventura dos quatro amigos mosqueteiros.

Mas Francine, você está chamando de aventura um livro onde quatro estudiosos só estudam e apresentam seus trabalhos em eventos literários de médio e grande porte? Mas quem disse que aventura é correr, pular, metralhar, matar pessoas? Aventura de verdade também acontece dentro da mente, que a cada explosão ganha nova vida, renasce, revive.

Quando uma história começa os personagens precisam ter um charme, aquela empatia que ninguém explica, mas sente, e assim aconteceu no começo de 2666. Agora estou mais íntima dos personagens e começo a conhecer suas rabugices, manias e desejos secretos. Aí vai um trecho de quando eles eram somente belezas:

No fim, sempre restavam eles quatro caminhando pelas ruas de Avignon com a mesma despreocupada felicidade com que haviam caminhado pelas enegrecidas e burocráticas ruas de Bremen, e como caminhariam pelas variegadas ruas que o futuro lhes tinha reservado, Morini empurrado por Norton, com Pelletier à sua esquerda e Espinoza à sua direita, ou Pelletier empurrando a cadeira de rodas de Morini, com Espinoza à esquerda e Norton, à frente deles, andando de costas e rindo com a plenitude dos seus vinte e seis anos, um riso magnífico que eles não tardavam em imitar embora certamente tivessem preferido não rir e só olhar para ela, ou então os quatro alinhados e parados junto à mureta de um rio historiado, isto é, um rio que não era mais selvagem, falando da sua obsessão alemã sem se interromperem uns aos outros, exercitando e degustando a inteligência do outro, com longos intervalos de silêncio que nem mesmo a chuva podia alterar.

(p. 27, tradução de Eduardo Brandão)

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3 Comentários

  1. Oi Francine,

    Adorei a sua idéia do Diário de leitura, infelizmente quando descobri seu blog o do Grande sertão: veredas já estava quase terminando e não tive pique de ler tudo desde o começo, mas agora estou acompanhando e já acho que vai ser uma ótima experiência. Quem sabe um dia tenho coragem de fazer isso no meu blog também, rs (fica tranquila que se isso acontecer citarei que você é autora da idéia).

    É isso… Parabéns pelo blog, sou mais uma de suas fãs.

    Bjos
    Carol

  2. Obrigada, Carol!
    Fazer um diário de leitura é muito gostoso, além da disciplina necessária, é bom também para registrar os breves pensamentos que a leitura proporciona.

    Beijão

  3. Concordo. Eu fiquei perdidão nessa parte. E tem aquela outra, do Amalfitano, no qual um dos 4 diz não ter entendido nada, e Amalfitano responde: Não para entender mesmo.

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