A Rosa do povo, livro escrito entre 1943 e 1945, tinha como cenário a Segunda Guerra Mundial e também as mudanças no Brasil com Getúlio Vargas e o “Estado Novo”, o que torna o texto de Drummond político.

A fonte que bebia Carlos Drummond de Andrade deveria ser infinita, pois em suas poesias é possível perceber o mundo pelo viés social, político, sentimental e existencial. E isto não acontece apenas se o leitor conhecer toda a obra do autor; acontece em um único livro ou poesia. Por que Drummond consegue tudo isso?

A rosa do povo
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Drummond foi um poeta da simplicidade, do cotidiano, mas também do barulho, da cidade, do caos, da novidade e, principalmente, do choque: “no meio do caminho”, quando lançado causou enorme pavor, pois muitos intelectuais e críticos da época não a consideraram como poesia. E hoje é uma das poesias mais admiradas e conhecidas não apenas no Brasil, mas no mundo.

O medo, a vida, a morte, a família…

A Rosa do povo, livro escrito entre 1943 e 1945, tinha como cenário a Segunda Guerra Mundial e também as mudanças no Brasil com Getúlio Vargas e o “Estado Novo”, o que torna o texto de Drummond político, junto com outros temas que fazem parte das preocupações humanas: o medo, a vida, a morte, a família – que são tão comuns para serem redescobertos em períodos de conflito social.

A poesia de Drummond parece trabalhar de duas formas: uma que leva o leitor para o sentimento; outra que envolve o poder de formar imagens perfeitas na mente, por uma cena do cotidiano, uma casa, uma pessoa, a pedra… Não existe melhor ou pior, apenas cada poesia à sua perfeição, seja por sensações ou ações. Como a vida de uma pessoa, toda a sua rotina e depois tudo o que se passa com os seus sentimentos.

Dualidades

Em A Rosa do Povo a beleza aparece de várias maneiras, se num poema temos rosa, natureza, perfume; em outros o chão, a terra, o povo. É a vida exterior e a interior, coisas palpáveis e intangíveis.

Alguns temas se destacam e se repetem, como exemplo, o tema da noite e da morte:

“É a hora em que o sino toca,
mas aqui não há sinos;
há somente buzinas,
sirenes roucas, apitos
aflitos, pungentes, trágicos
uivando escuro segredo;
desta hora tenho medo.

(…)

É a hora do descanso,
mas o descanso vem tarde,
o corpo não pede sono,
depois de tanto rodar;
pede paz – morte – mergulho
no poço mais ermo e quedo;
desta hora tenho medo.

Hora de delicadeza,
gasalho, sombra, silêncio.
Haverá disso no mundo?”

Nesta poesia, chamada “Anoitecer” (p. 33), Drummond fala da rua, do barulho, da cidade, mas também de um corpo cansado, assustado com a possibilidade de morrer.

Em outra poesia, chamada “Passagem da Noite” (p. 48), há a sensação de tristeza, de algo sombrio, mas ao final, brilhantemente, temos a felicidade. É um exemplo da vida cotidiana, da noite que chega e revela as aflições da alma, mas que logo vem o dia, que deixa tudo mais claro, feliz e possível.

“É noite. Sinto que é noite
não porque a sombra descesse
(bem me importa a face negra)
mas porque dentro de mim,
no fundo de mim, o grito
se calou, fez-se desânimo.

(…)

E que adianta uma lâmpada?
E que adianta uma voz?
É noite no meu amigo.
É noite no submarino.

(…)

Tudo que à noite perdemos
se nos confia outra vez.
Obrigado, coisas fiéis!
Saber que ainda há florestas,
sinos, palavras; que a terra
prossegue seu giro, e o tempo
não murchou; não nos diluímos.
Chupar o gosto do dia!
Clara manhã, obrigado,
o essencial e viver!”

A rosa do povo: pessimismo e esperança

Ao final da leitura, é possível perceber com clareza os temas abordados por Drummond. Usei como exemplo a noite, mas há também o medo, a família, a vida e a morte, cercados pela guerra e pela tensão política. É uma miscelânea que aquece o coração do leitor, porque em tudo isso Drummond nos mostra um tipo de compreensão sobre pessimismo e esperança.

Por fim, ler Drummond é permanecer em contato com a vida em seus inúmeros formatos. A sua poesia sem métrica, sem rima, tão repleta de simbologias diz muito sobre cada um de nós e, ao mesmo tempo, sobre o mundo todo.

Assista ao vídeo no canal Livro&Café: 

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Conheça mais uma obra-prima de Drummond: Boitempo: uma bela composição da vida

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