Não restam dúvidas que o escritor inglês William Shakespeare (1564-1616) é conhecido como um dos maiores autores de todos os tempos. Dominou a arte dos sonetos (um tipo de poema específico por sua complexidade nas métricas e rimas) e deixou uma vasta coleção com temas variados, como o amor, a morte, a passagem do tempo, o ciúmes, a inveja entre tantos outros temas universais. Para refletir mais sobre isso e tirar suas próprias conclusões, abaixo você encontra os 15 melhores sonetos de William Shakespeare.

    Soneto 1 (William Shakespeare)

    Dos seres ímpares ansiamos prole
    Para que a flor do Belo não se extinga,
    E se a rosa madura o Tempo colhe,
    Fresco botão sua memória vinga.

    Mas tu, que só com os olhos teus contrais,
    Nutres o ardor com as próprias energias
    Causando fome onde a abundância jaz,
    Cruel rival, que o próprio ser crucias.

    Tu, que do mundo és hoje o galardão,
    Arauto da festiva Natureza,
    Matas o teu prazer inda em botão

    E, sovina, esperdiças na avareza.
    Piedade, senão ides, tu e o fundo
    Do chão, comer o que é devido ao mundo. 

    Sonetos de William Shakespeare
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    Soneto 5 (William Shakespeare)

    As horas que suavemente emolduraram
    O olhar amoroso onde repousam os olhos
    Serão eles o seu próprio tirano,
    E com a injustiça que justamente se excede;

    Pois o Tempo incansável arrasta o verão
    Ao terrível inverno, e ali o detém,
    Congelando a seiva, banindo as folhas verdes,
    Ocultando a beleza, desolada, sob a neve.

    Então, os fluidos do estio não restaram
    Retidos nas paredes de vidro,
    O belo rosto de sua beleza roubada,

    Sem deixar resquícios nem lembranças do que fora;
    Mas as flores destilaram, sobreviveram ao inverno,
    Ressurgindo, renovadas, com o frescor de sua seiva.

    Soneto 12

    Quando a hora dobra em triste e tardo toque
    E em noite horrenda vejo escoar-se o dia,
    Quando vejo esvair-se a violeta, ou que
    A prata a preta têmpora assedia;

    Quando vejo sem folha o tronco antigo
    Que ao rebanho estendia a sombra franca
    E em feixe atado agora o verde trigo
    Seguir no carro, a barba hirsuta e branca;

    Sobre tua beleza então questiono
    Que há de sofrer do Tempo a dura prova,
    Pois as graças do mundo em abandono

    Morrem ao ver nascendo a graça nova.
    Contra a foice do Tempo é vão combate,
    Salvo a prole, que o enfrenta se te abate. 

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    Soneto 14

    Dos astros não retiro entendimento
    Embora eu tenha cá de astronomia,
    Mas não para prever a sorte, o intento
    Das estações, ou fome, epidemia;

    Nem sei dizer o que será do instante,
    Prever a alguém quer chuva, ou vento, ou raio;
    Se tudo há-de sorrir ao governante
    Segundo as predições que aos céus extraio.

    De teus olhos provêm meus atributos
    E, astros constantes, leio ali tal arte:
    Que a verdade e a beleza darão frutos

    Se em ti deixas de tanto reservar-te;
    Ou um vaticínio sobre ti revelo:
    Teu fim põe termo ao verdadeiro e ao belo.

    Soneto 18

    Se te comparo a um dia de verão
    És por certo mais belo e mais ameno
    O vento espalha as folhas pelo chão
    E o tempo do verão é bem pequeno.

    Ás vezes brilha o Sol em demasia
    Outras vezes desmaia com frieza;
    O que é belo declina num só dia,
    Na terna mutação da natureza.

    Mas em ti o verão será eterno,
    E a beleza que tens não perderás;
    Nem chegarás da morte ao triste inverno:

    Nestas linhas com o tempo crescerás.
    E enquanto nesta terra houver um ser,
    Meus versos vivos te farão viver.

    Soneto 19

    Tempo voraz, ao leão cegas as garras
    E à terra fazes devorar seus genes;
    Ao tigre as presas hórridas desgarras
    E ardes no próprio sangue a eterna fênix.

    Pelo caminho vão teus pés ligeiros
    Alegres, tristes estações deixando;
    Impões-te ao mundo e aos gozos passageiros,
    Mas proíbo-te um crime mais nefando:

    De meu amor não vinques o semblante
    Nem nele imprimas o teu traço duro.
    Oh! Permite que intacto siga avante

    Como padrão do belo no futuro.
    Ou antes, velho Tempo, sê perverso:
    Pois jovem sempre há-de o manter meu verso. 

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    Soneto 23 (William Shakespeare)

    Como no palco o ator que é imperfeito
    Faz mal o seu papel só por temor,
    Ou quem, por ter repleto de ódio o peito
    Vê o coração quebrar-se num tremor,

    Em mim, por timidez, fica omitido
    O rito mais solene da paixão;
    E o meu amor eu vejo enfraquecido,
    Vergado pela própria dimensão.

    Seja meu livro então minha eloqüência,
    Arauto mudo do que diz meu peito,
    Que implora amor e busca recompensa

    Mais que a língua que mais o tenha feito.
    Saiba ler o que escreve o amor calado:
    Ouvir com os olhos é do amor o fado.

    Soneto 25

    Deixa aqueles cuja sorte brilha nas estrelas
    Gabarem-se das públicas e nobres pompas,
    Enquanto eu, impedido de tal fortuna,
    Não procurei a alegria naquilo que mais prezava.

    Dos príncipes os diletos espalham belas flores,
    Mas como o mal-me-quer sob o sol,
    E em si mesmos jaz enterrado seu orgulho,
    Cuja glória fenece sob um mero olhar.

    O esforçado guerreiro, notável por suas batalhas,
    Após mil vitórias, ao perder uma delas,
    Tem seu nome riscado do livro das honrarias,

    E vê esquecido tudo por que lutou.
    Feliz sou eu, que amo e sou amado,
    De onde não me movo nem sou movido.

    Soneto 35

    Não chores mais o erro cometido;
    Na fonte, há lodo; a rosa tem espinho;
    O sol no eclipse é sol obscurecido;
    Na flor também o inseto faz seu ninho;

    Erram todos, eu mesmo errei já tanto,
    Que te sobram razões de compensar
    Com essas faltas minhas tudo quanto
    Não terás tu somente a resgatar;

    Os sentidos traíram-te, e meu senso
    De parte adversa é mais teu defensor,
    Se contra mim te escuso, e me convenço

    Na batalha do ódio com o amor:
    Vítima e cúmplice do criminoso,
    Dou-me ao ladrão amado e amoroso.

    Soneto 73 (William Shakespeare)

    Em mim tu podes ver a quadra fria
    Em que as folhas, já poucas ou nenhumas,
    Pendem do ramo trêmulo onde havia
    Outrora ninhos e gorjeio e plumas.

    Em mim contemplas essa luz que apaga
    Quando no poente o dia se faz mudo
    E pouco a pouco a negra noite o traga,
    Gêmea da morte, que cancela tudo.

    Em mim tu sentes resplender o fogo
    Que ardia sob as cinzas do passado
    E num leito de morte expira logo

    Do quanto que o nutriu ora esgotado.
    Sabê-lo faz o teu amor mais forte
    Por quem em breve há de levar a morte

    Soneto 88

    Quando me tratas mau e, desprezado,
    Sinto que o meu valor vês com desdém,
    Lutando contra mim, fico a teu lado
    E, inda perjuro, provo que és um bem.

    Conhecendo melhor meus próprios erros,
    A te apoiar te ponho a par da história 
    De ocultas faltas, onde estou enfermo;
    Então, ao me perder, tens toda a glória.

    Mas lucro também tiro desse ofício:
    Curvando sobre ti amor tamanho,
    Mal que me faço me traz benefício,

    Pois o que ganhas duas vezes ganho.
    Assim é o meu amor e a ti o reporto:
    Por ti todas as culpas eu suporto.

    Soneto 113

    Desde que te deixei, meus olhos se ensimesmaram,
    E quem me leva a caminhar livre
    Em parte, vê e, em parte, está cego,
    Pensando ver, mas, na verdade, não vê;

    Pois não indica nenhuma forma ao coração
    De pássaro, flor, ou silhueta, que consiga divisar;
    Desses fugidios objetos a mente não se ocupa,
    Nem sua vista se detém sobre o que possa vislumbrar;

    Pois diante da mais branda ou mais rude visão,
    A mais formosa ou deformada criatura,
    A montanha ou o mar, o dia ou a noite,

    Corvo ou pomba, empresta a eles tua forma.
    Incapaz de ver outra coisa, tão cheia de ti,
    Minha mente certa torna meus olhos incertos.

    Soneto 116 (William Shakespeare)

    De almas sinceras a união sincera
    Nada há que impeça: amor não é amor
    Se quando encontra obstáculos se altera,
    Ou se vacila ao mínimo temor.

    Amor é um marco eterno, dominante,
    Que encara a tempestade com bravura;
    É astro que norteia a vela errante,
    Cujo valor se ignora, lá na altura.

    Amor não teme o tempo, muito embora
    Seu alfange não poupe a mocidade;
    Amor não se transforma de hora em hora,

    Antes se afirma para a eternidade.
    Se isso é falso, e que é falso alguém provou,
    Eu não sou poeta, e ninguém nunca amou.

    Soneto 138

    Quando jura ser feita de verdades,
    Em minha amada creio, e sei que mente,
    E passo assim por moço inexperiente,
    Não versado em mundanas falsidades.

    Mas crendo em vão que ela me crê mais jovem
    Pois sabe bem que o tempo meu já míngua,
    Simplesmente acredito em falsa língua:
    E a patente verdade os dois removem.

    Por que razão infiel não se diz ela?
    Por que razão também escondo a idade?
    Oh, lei do amor fingir sinceridade

    E amante idoso os anos não revela.
    Por isso eu minto, e ela em falso jura,
    E sentimos lisonja na impostura. 

    Soneto 154 (William Shakespeare)

    O pequeno deus do amor certa vez dormia
    Deixando ao lado sua flecha amorosa,
    Enquanto várias ninfas, jurando-se sempre castas,
    Vieram, pé ante pé, mas, em sua mão virginal,

    A mais bela tomou o fogo
    Que incendiara legiões de corações verdadeiros;
    Assim, a lança do desejo ardente
    Dormia desarmada ao lado da mão desta jovem.

    A flecha, ela mergulhou em um poço de água fria,
    Que se acendeu com o eterno fogo do Amor,
    Criando um banho e um bálsamo

    Para os enfermos; mas eu, jugo de minha senhora,
    Vim para me curar, e isto, assim, eu provo,
    O fogo do amor aquece a água, mas a água não esfria o amor.

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