Noite de Festa é um conto que Virginia Woolf escreveu entre 1918 e 1925. É difícil mensurar a data correta, pois durante todo esse período ela fez breves menções sobre a obra em seu diário. A data de publicação do conto também é incerta, pois algumas fontes afirmam que o conto apareceu em uma coletânea de esboços chamada Cracked Fiddles, porém, não há registros sobre essa coletânea ter sido publicada ou não. Então, os estudiosos acabam usando o período entre 1918 a 1925, porque os outros contos escritos pela autora neste período possuem muitas similaridades no estilo e também há registros sobre o conto, no mesmo período, no diário da autora.

    Um monólogo interior?

    A princípio, a história tem uma característica de monólogo interior, pois é como se o narrador convidasse o leitor a participar da festa e, depois, ele próprio se vê na festa:

    “Onde estamos? Que casa pode ser a cada da festa? (…) Ah – dobrando a esquina, ali no meio, lá onde a porta está aberta – , espere um momento. (…) Venha, porque senão nos atrasamos.”
    (p. 125, tradução de Leonardo Fróes, Contos Completos)

    Noite de festa está presente no livro “Contos completos

    Mas na sequência, o que temos é a técnica do fluxo de consciência, que propõe uma narrativa com base nos pensamentos de cada personagem. É possível perceber, de um jeito sutil e que demanda atenção, que o conto, então, é sobre duas pessoas conversando numa festa e que são interrompidas, naturalmente, por outras.

    Apaixonante…

    A própria autora afirmou em seu diário que “uma conversa emocionante, toda, ou quase toda, em diálogo.” E realmente o conto provoca alguns tipos de emoções. É compreensível que cada leitor receberá essas sensações de formas diferentes, porém, se há alguma paixão pela noite ou por conversas não lineares, mas que nas entrelinhas dizem belas e profundas coisas sobre a vida, o leitor irá se apaixonar:

    Doce é o ar da noite. (p. 125)

    “Queimando, não pensando. E assim todos os livros por trás de nós.” (p. 126)

    “Tenho certa crença mística de que todo o tempo passado e o futuro também, as lágrimas e cinzas das gerações, coagularam-se numa bola; éramos então absolutos e inteiros; nada então era excluído; e uma coisa era certa – felicidade. Mais tarde porém, quando a gente os segura, esses globos de cristal se dissolvem.” (p. 128)

    “Coisa estranha é o silêncio. A mente se torna como uma noite sem estrelas; mas de repente um meteoro desliza, esplêndido, atravessando a escuridão, e se extingue. Por essa diversão, nunca dizemos suficientemente obrigado. ” (p. 129)

    “A literatura é um registro do nosso descontentamento” (p. 129)

    “Gosto do som melancólico do mar distante” (p. 130)

     “As luzes se levantam e caem; a água é rala como o ar; por trás dela está a lua. Você afunda? Ou você se levanta? Você enxerga as ilhas? Sozinha comigo.” (p. 132)

    Leia também: O quarteto de cordas (Virginia Woolf): a beleza que pode morar no cotidiano

    O lugar real e outro imaginado

    A crítica publicada no site Mantex informa que não fica claro, na primeira leitura, o ponto de vista em que a história está sendo narrada, mas que, com uma leitura mais atenta, percebe-se que há dois locais no conto, ao mesmo tempo: um real e outro imaginado pelo narrador. Assim, não há dúvidas quanto ao emprego do fluxo de consciência no conto, pois nesse tipo de “caminho” temos a vida real, a fala, a comunicação, o diálogo, mas também a vida interior, dos pensamentos, imaginados. No caso do conto, é a festa em si e o mar.

    Durante a festa, a conversa é sobre literatura clássica. A impressão é que eles estão próximos a uma biblioteca. Outras pessoas interrompem a conversa, de um jeito, propositalmente confuso, como são mesmo confusas e deliciosas as festas. De repente, há breves comentários sobre o mar, a natureza, o tempo, o que pode caracterizar os dois ambientes do conto, o real e o imaginário, pois não há evidências concretas que a casa do conto era próxima ao mar ou que, da janela, era possível ver as ondas. Mas, lindo é que, a última frase, retoma a primeira impressão do conto, como se o narrador convidasse o leitor a estar na festa. Como se Virginia Woolf pegasse em sua mão:

    “Vamos. Faz escuro no matagal sob a lua. Vamos, haveremos de enfrenta-las, essas ondas de escuridão coroadas pelas árvores, que se erguem para sempre, solitárias, trevosas. As luzes se levantam e caem; a água é rala como o ar; por trás dela está a lua. Você afunda? Ou você se levanta? Você enxerga as ilhas? Sozinha comigo.” (p. 132)

    Um tema recorrente…

    É importante destacar que o tema festa está presente em outros livros e contos da autora. Como o caso do romance Mrs. Dalloway, em que a personagem principal está organizando uma festa em sua casa. No posfácio do livro “Contos Completos”, da editora CosacNaify, consta a informação que um dos personagens que aparece neste conto seria um precursor do personagem – e também professor, Briely, que aparece rapidamente no livro Mrs. Dalloway. Por aqui, também faço referências a Nevill, que, o nome, também pode ter alguma ligação com o personagem Neville, do livro As Ondas. E assim, podemos dizer que o conto Noite de Festa é sobre festas, claro, mas também sobre conversas inspiradoras, a natureza, a cidade e o mar.

    Assista ao vídeo sobre o conto “Noite de festa” no canal Livro&Café

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