Virginia Woolf sobreviveu a uma pandemia e escreveu sobre isso em sua obra ficcional e não-ficcional

    Hoje, não importa onde vivemos no mundo, estamos sentindo os efeitos da pandemia do coronavírus. Os eventos são cancelados ou adiados e a viagem é reduzida. Dizem para ficarmos em casa e só sair quando necessário, mantendo o distanciamento físico quando nos aventuramos nas ruas para comprar alimentos e outras necessidades básicas.

    Virginia e Leonard Woolf viveram a pandemia de seu tempo (a gripe espanhola), que se espalhou pelo mundo entre 1918-1919, enquanto o casal morava em Richmond.

    Estima-se que a gripe espanhola tenha matado 100 milhões de pessoas em todo o mundo e mais de 250.000 somente na Grã-Bretanha.

    A gripe espanhola também afetou pessoas próximas aos Woolfs. Em julho de 1918, em seu diário, Virginia registrou que uma vizinha teve influenza, relatando mais tarde que a mulher sucumbiu à doença.

    Virginia Woolf e a gripe espanhola

    Segundo os estudiosos da autora, Virginia Woolf sobreviveu a uma pandemia, pois a gripe que contraiu no final de 1919 fazia parte da pandemia da época. Porém, não foi sua primeira luta contra a gripe; nem seria a última, pois ela sofreu com isso em 1916, nos primeiros meses de 1918, antes da gripe espanhola chegar à Grã-Bretanha, e novamente em 1922, 1923 e 1925.

    Em 20 de outubro de 1918, Woolf escreveu em seu diário:

    “A dor é abominável para todos os Stracheys, mas, ao permitir exageros e terrores à pobre criatura, Lytton já teve uma dose suficiente de horror, imagino, e o médico adverte, principalmente [Dora] Carrington, que os sintomas podem durar meses. No entanto, Lytton provavelmente está … evitando Londres, por causa da gripe (estamos, aliás, no meio de uma praga inigualável desde a Peste Negra, segundo o Times.)…” 

    Lytton Strachey (escritor) e Dora Carrington (pintora) eram amigos de Virginia Woolf e pertenciam ao Grupo Bloomsbury.

    O ensaio “Sobre estar doente”

    Virginia Woolf sobreviveu a uma pandemia
    Edição de 1930, Hogarth Press

    As experiências de Virginia com doenças a levaram a escrever o ensaio On Being Ill (Sobre estar doente), publicado em 1930 pela Hogarth Press. No Brasil, o ensaio está presente no livro “O valor do riso e outros ensaios“, lançado pela Cosac Naify em 2014.

    Com habilidade, Virginia Woolf discorre sobre o tema da doença na literatura:

    “… quando pensamos em tudo isso e infinitamente mais, como com tanta frequência somos forçados a fazê-lo, parece realmente estranho que a doença não tenha encontrado o seu lugar, junto com o amor, o ciúme e a batalha, entre os temas primais da literatura”

    p. 185

    Agora que nossa própria pandemia tomou o centro do palco em todo o mundo, alguns estudiosos estão escrevendo sobre como as epidemias do passado foram descritas na literatura, no cinema e nas artes. Após ler o ensaio de Virginia Woolf, temos a impressão que pouco foi feito sobre o assunto e, claro, precisamos falar mais sobre isso.

    Mrs Dalloway e a pandemia

    A pandemia de 1918 também fez parte do romance Mrs. Dalloway (1925), mas esse fato costuma atrair atenção mínima. Quando se trata de investigar as condições de saúde nesse romance, a doença psicológica do personagem Septimus Smith recebe a maior parte da atenção de críticos e leitores. No entanto, a pesquisadora Elizabeth Outka argumenta em seu livro que Woolf centrou o romance na gripe e apresenta Clarissa Dalloway como uma sobrevivente de uma pandemia.

    Por fim, uma publicação no site da British Library adota uma abordagem semelhante e inclui uma citação do romance.

    Clarissa é quase certamente uma vítima da pandemia de gripe de 1918 a 2020, mas ela também deve ser um dos espectros remanescentes do romance: “Desde sua doença, ela ficou quase branca.” (31).


    Referências:

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