O meu exemplar de As Virgens Suicidas possui uma história de quase-morte, o que o torna diferente de qualquer outro. Ele foi encontrado na garagem, debaixo do carro, logo após uma tempestade que alagou diversos pontos da cidade. Encharcado, torto, com cheiro de barro, o livro permaneceu por três dias pendurado no varal.

    Passado o susto que o carteiro pregou, o meu exemplar de As Virgens Suicidas possui diversas páginas manchadas, 80% dele está ondulado, torto, com a lateral quase solta, com uma cola que parece ter sofrido muito pela insistência da umidade que por ali permaneceu. O livro quase morreu, mas, ufa, diferente das personagens que ele conta, a vida permaneceu nele e não permitiu que nenhuma linha se estragasse ao ponto da leitura ser impossível. Meu livro permaneceu vivo para contar uma história sobre suicídio.

    Jeffrey Eugenides é americano, nasceu em 1960 em Detroit e é considerado um dos melhores escritores de sua geração. Sofia Copola fez uma versão para o cinema sobre As Virgens Suicidas em 1999 e o seu romance “Middlesex” (2002) ganhou o Prêmio Pulitzer.

    O cenário

    Em As Virgens Suicidas temos o cenário dos EUA nos anos 70, o subúrbio e uma família tradicional: marido, esposa e cinco filhas. A narração fica por conta de um vizinho da família, que faz parte da história, expõe sua opinião e apenas o seu olhar perante as meninas suicidas é declarado. É um enredo simples, mas bem desenhado página a página.

    O livro é todo construído por silêncios, que podemos nomear de diversas formas, mas fica m aberto devido à complexidade em taxar o suicídio (algo tão complexo) como uma coisa ou outra. De certa forma, esse silêncio carregado em cada página, é o registro das próprias irmãs suicidas, mesmo durante uma festa – música, conversa, danças – parece que tudo está abafado pelo silencioso interior de cada uma delas: Cecília (13 anos), Lux (14 anos), Bonnie (15 anos), Mary (16 anos) e Therese (17 anos).

    Suicídios

    O primeiro suicídio é registrado nas primeiras páginas do livro, assim como a clareza que as outras meninas também tiraram a própria vida. O que cria um ambiente belo e trágico são as descrições do narrador, que criam quadros lindamente melancólicos e, mesmo sabendo que o próximo quadro também será assim, não dá vontade de para a leitura, pois há um elemento misterioso no romance que, em doses lentas, provoca o leitor a querer saber como o narrador sabe da história das irmãs Lisbon.

    A obra de Jeffrey Eugenides, como ele mesmo informou (li na orelha do livro), é sobre os valores e sentimentos relacionados ao sonho americano. Em meio a uma sociedade que quer viver uma vida perfeita, quando a morte acontece de uma forma tão trágica ou as pessoas mergulham numa infinita tristeza e depressão ou fingem que a tragédia não é assim tão complicada (os vizinhos, a televisão, a escola, a sociedade, a família).

    Quando Cecília morre, os vizinhos mostram um sentimento coletivo de querer ajudar a família Lisbon, eles retiram a cerca pontuda que a menina usou para se matar, porém, essa atitude é superficial, pois tiram apenas o instrumento que a virgem suicida usou e não buscam a causa, o motivo que levou Cecília a dar o ponta pé inicial na grande tragédia. Parece que os vizinhos têm medo de encontrar o verdadeiro motivo das meninas Lisbon (que talvez nem elas saibam). E esse medo da realidade é mostrado em outras estruturas, principalmente a televisão, que faz o caso das garotas se tornar um show superficial, dramático e mentiroso.

    A família

    Os pais de Cecília eram muito rígidos, conservadores, religiosos e usaram como estratégia de manter as meninas seguras o distanciamento da vida lá fora, principalmente após a morte de Cecília. Eles não sabiam o que fazer com as filhas; elas não sabiam o que fazer com a vida.

    Uma leitura rápida, fácil, agradável, ao mesmo tempo densa, repleta de reflexões, uma beleza trágica, um mistério quase concreto, como o momento de decidir pela vida ou não.

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