A jornalista Daniela Arbex, no livro “Holocausto brasileiro” (Geração Editorial, 2013), traça um retrato forte e chocante dos anos de funcionamento do Hospital Colônia de Barbacena, em Minas Gerais.
O Colônia, como era conhecido, foi um hospital psiquiátrico que, por quase cem anos, funcionou mais como um depósito de rejeitados do que como uma instituição para acolher pacientes com distúrbios mentais. Na verdade, a autora mostra que 70% dos internos sequer tinha alguma deficiência, eram jovens estupradas pelos patrões que engravidavam, rapazes tímidos, alcoolistas ou simplesmente pessoas sem documentos.
Vida, Genocídio e 60 Mil Mortes no Maior Hospício do Brasil
Na introdução, Eliane Brum nos conta que Daniela iniciou suas pesquisas quando seu filho tinha quatro meses de vida. É difícil imaginar como ela conseguiu conciliar os relatos que recolheu e a rotina de cuidados com o bebê, a mistura de sentimentos pode ter sido decisiva para que ela escrevesse da forma comovente que fez.
Ah, e não adianta, nada vai te preparar para o horror encontrado nas 255 páginas de “Holocausto brasileiro”. Então por que você deve lê-lo? Se bem direcionada, a indignação diante das injustiças pode ser um dos melhores sentimentos. E essa é a riqueza do livro, carregar as histórias dessas pessoas e conservar a memória. Além dos profissionais inescrupulosos, os pacientes foram vítimas de descaso e desprezo da população, não só local, mas também nacional, já que a primeira reportagem-denúncia foi publicada nos anos 70.
O último parágrafo do livro nos chama à responsabilidade e abre nossos olhos para “projetos” de Colônia que o poder público tenta nos vender como solução.
O fato é que a história do Colônia é a nossa história. Ela representa a vergonha da omissão coletiva que faz mais e mais vítimas no Brasil. Os campos de concentração vão além de Barbacena. Estão de volta nos hospitais públicos lotados que continuam a funcionar precariamente em muitas cidades brasileiras. Multiplicam-se nas prisões, nos centros de socioeducação para adolescentes em conflito com a lei, nas comunidades à mercê do tráfico. O descaso diante da realidade nos transforma em prisioneiros dela. Ao ignorá-la, nos tornamos cúmplices dos crimes que se repetem diariamente diante de nossos olhos. Enquanto o silêncio acobertar a indiferença, a sociedade continuará avançando em direção ao passado de barbárie. É tempo de escrever uma nova história e de mudar o final.
(parágrafo que encerra o livro)
Para quem se interessou e tiver oportunidade, o último diretor do hospital, junto com a Fundação Hospitalar do Estado de Minas e a Fundação Municipal de Cultura de Barbacena, criou o Museu da Loucura com fotos, instrumentos “terapêuticos” e registros dos pacientes. Ele passa por reformas, mas continua agendando visitas pelo telefone (32)3339-1611. O museu fica na Rua 14 de agosto, sem número, Bairro Floresta – Barbacena (MG).