Lendo os diários, encontrei no ano de 1931 uma anotação do dia de Natal de Virginia Woolf.
Tentar imaginar o cotidiano de Virginia Woolf é um simples exercício de aproximação com algo que tanto me fascina. Imaginar alguém que você tanto admira vivendo a vida como ela é. Ir ao mercado, dirigir, acordar com dor de cabeça, chorar sem motivo, frequentar lugares chatos, se encantar porque uma linda borboleta voa baixo pelo jardim.
Isso tudo, e muito mais, perpetua a vida das pessoas comuns, mas também das pessoas que inspiram nossas vidas. Assim é minha vida com Virginia Woolf. Então peguei os diários dela para procurar o natal de Virginia Woolf. Como ela vivia a vida neste dia?
Reparei que em muitos anos, o diário termina em outubro e só retorna no ano seguinte, o que pode ser um sinal de que ela gostava de usar o final do ano para descansar até mesmo de seu diário, mas, por outro lado, sabemos que Virginia Woolf tinha suas fases difíceis, em que a depressão tomava conta de seus dias, colocando-a na cama, sem vontade de nada. Entretanto, encontrei no ano de 1931 uma anotação do dia de Natal, a qual transcrevo abaixo. No seu Natal, que seja possível estar ao lado das pessoas que você mais ama e que os sentimentos bons, o amor pela vida e pelo próximo perpetuem por todos os dias.
[Dezembro, 1931]
Virginia Woolf, Diário, volume II 1927 – 1941
Sexta. Dia de Natal. De manhã
[Monk’s House, Rodmell]
O Lytton ainda está vivo esta manhã. pensávamos que não resistisse a esta noite. Foi uma noite de luar. A Nessa telefonou às dez para dizer que ele tinha bebido leite e chá depois de uma injeção. Quando ela foi para Hungerford, ontem, estavam por lá todos em grande desespero. Havia vinte e quatro horas que ele não ingeria nada, e estava quase inconsciente. Pode ser o ponto de virage, ou pode não ter qualquer significado. Vamos almoçar com os Keynes. E de novo tudo me recorda, numa explosão, numa expansão, e eu começo a pensar nas coisas que lhe hei-de dizer, tão forte é o desejo de viver – o triunfo da vida.
Uma suave manhã de neblina.
Depois de ter escrito a última página, em 16 de Novembro, não fui capaz de continuar a escrever sem ficar com uma perpétua dor de cabeça; de modo que tirei um mês de férias e fiquei deitada; não tenho escrito uma linha que seja; li o Fausto [de Goethe], li Coningsby, etc., e estive com o Clive, com a Christabel, a Nessa, Miss Bowen, Alice Ritchie, isto até há quinze dias, quando soube do Lytton. Há um mês que ele está doente. Tenho vivido mais uma vez, todos os graus da emoção; depois o telefone; depois a Angelica veio cá; depois fomos visitar o James; depois viemos para cá na terça-feira passada, uma viagem negra, uma árvore fez-me lembrar o Lytton. Fomos a Bringhton ontem. Tudo muito sereno, em neblina; um céu azul e nuvens brancas ontem à noite. Falei com o L. ontem à noite sobre a morte; a estupidez da morte; o que ele iria sentir se eu morresse. Ele abandonaria talvez a editora; mas disse que uma pessoa deve ser natural. E a sensação de velhice a invadir-nos: e o sofrimento de perde os amigos; e a minha antipatia pela geração mais nova; e depois raciocino que devo ser compreensiva. E agora estamos mais felizes.
Bertrand Editora, Portugal
Tradução de Maria José Jorge