“Cheio de autoconfiança, ele teve uma vaga lembrança da sensação que tinha na juventude. Consistia, em parte, do sentimento de imersão em um rito místico do qual os outros não compartilhavam, em parte, da sensação puramente física do vento no cabelo e no rosto e, em parte, da tênue noção de perigo”
(p. 175, As Cavernas de Aço, Isaac Asimov)

O mito da caverna

Platão, no livro “A república”, na parte VI, fala sobre o mito da caverna. Ele sugere que as pessoas estão presas numa caverna e, sem perceberem que estão acorrentadas, se divertem apenas pelas sombras em um palco, formadas por uma fogueira. Assim, as pessoas – alienadas, veem apenas essas imagens, nada além, mas se sentem bem com isso. Com o passar do tempo, elas nomeiam essas sombras, assim como nomeamos todas as coisas, e se sentem importantes por isso, como se essa fosse uma única realidade, que traz conforto e um tipo de confiança.

Porém, há um mundo lá fora, totalmente desconhecido, em que elas nunca terão a oportunidade de conhecer, porque não desejam mais nada além daquilo que já possuem. Mas – ainda bem que existe o “mas”, alguém decide investigar sobre essas sombras e descobre o quanto elas são supérfluas, por serem apenas sombras. E assim, uma chama de desejo pelo desconhecido nasce: a percepção da porta de saída, o mundo lá fora, a natureza e todas as suas cores e possibilidades.

Uma caverna tecnológica

As Cavernas de Aço (Isaac Asimov):
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No livro “As cavernas de aço“, do escrito e cientista Isaac Asimov, vamos conhecer um futuro em que as pessoas vivem dentro de uma grande caverna tecnológica, cheia de “conforto” e de zero necessidade de, no mínimo, olhar pela janela, mesmo ela estando lá, à disposição.

O personagem principal é Baley, um policial que ganha a tarefa mais difícil da sua vida: descobrir porque um extraterrestre, que vive também na Terra, em um tipo de bairro dedicado a esses seres alienígenas, foi morto de um jeito considerado impossível.

Portanto, essa grande caverna de aço representa como seria o nosso futuro. A certeza é que viveríamos trancados em grandes prédios composto de todas as nossas necessidades, desde trabalho a diversão. E acharíamos tudo maravilhoso, mesmo com alguns indícios sobre o inevitável fim das nossas reservas de energia, alimentos, etc.

As pessoas, então, ficam divididas entre aquelas que ainda acreditam que o mundo lá fora pode ser melhor, outras que odeiam os robôs e fazem rebeliões para que eles não façam parte de sua vida cotidiana e ainda um outro grupo que apenas vive, sem se importar com mais nada.

A presença de robôs

Baley e a sua família não gostam dos robôs e vivem confortavelmente na caverna de aço, porque a sua profissão permite algumas regalias, como almoçar na própria casa – os outros almoçam em grande restaurantes coletivos em que a comida (regrada) sobe por um compartimento instalado na própria mesa. Assim, quando Baley descobre que o seu novo parceiro de trabalho é um robô de altíssima geração, ele fica muito desconfortável, mas encara a tarefa de quebrar os seus preconceitos e, principalmente, porque se ele desvendar esse crime, a sua família poderá usufruir de outras regalias de sua caverna moderna.

O robô policial, um dos mais modernos desenvolvidos por esse seres de outro planeta que moram na Terra, se parece muito com um humano, ficando difícil a sua identificação, mas como ele começa a frequentar a caverna de aço, um lugar cheio de pessoas que odeiam os robôs porque acreditam que eles irão substituir os seus empregos, logo a sua identidade é descoberta, o que faz aumentar a tensão da história: Baley, além de desvendar um crime, tem que assegurar que nada irá acontecer com o robô e ainda contornar a difícil tarefa de fazer sua mulher entender a sua nova condição de quase “amigo” de um robô.

A sociedade é controversa

Como em toda a sociedade, há grupos que se reúnem para discutir sobre o passado, que consideram glorioso, quando as pessoas viviam a céu aberto, próximas à natureza, em um planeta em que ainda era possível respirar ar puro, plantar o próprio alimento, etc. Essas pessoas são chamados de Medievalistas e são eles que logo percebem um robô vivendo dentro da caverna de aço.

O livro, então, além da trama policial e de mostrar como é importante olhar para fora, pode também ser analisado como uma obra que discute a nossa convivência e tolerância independente do tempo em que se vive. Questões de moral e ética vão se apresentando de um jeito sutil, mas que fará o leitor pensar sobre como será o futuro em que as máquinas se mostrarão mais inteligentes que os humanos. Será que esse dia já chegou?

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Confira a resenha do livro “Eu, robô”, também de Isaac Asimov

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3 Comentários

  1. Caramba! Enfim encontrei alguém que compartilha da mesma opinião que eu haha
    Logo que comecei a adentrar na história e então “descobri” o significado do título do livro, na hora me veio à mente o Mito da Caverna e as suas implicações no contexto aplicado do livro.
    Além de outras inúmeras questões críticas que o autor vai nos jogando na cara ao longo da narrativa.
    De fato é um livro pra ser 5 estrelas, mas que pra mim só pecou um pouco na escrita (alguns momentos achei ela enrolada).

    Mas fora isso, é um livro e tanto. Em breve vou ler as continuações ♥

  2. Milene Martins on

    Francine, parabéns por mais um texto interessantíssimo!
    Eu li Asimov há tanto tempo que não me recordo do título. Mas gostei. E não tenho dúvida de que vou gostar desse livro, ainda mais depois dessa resenha. Nós, humanos, precisamos sim nos acostumar com os robôs. Que façamos isso através da literatura, uma arte com o poder de nos questionar. Os robôs devem ser temidos, não porque vão roubar todo e qualquer emprego. Mas porque já estão substituindo humanos em certas tarefas de alguns empregos. Portanto, se o seu emprego é de tarefa única e essa é altamente mecânica e repetitiva, crie resiliência! Enfim, tenho uma quedinha por trama policial. As Cavernas de Aço acabaram de entrar para a minha lista das ambições.

  3. Francine Ramos on

    Oi, Milene! Adoro seus comentários! Obrigada por ler a resenha! \o/
    Eu lembro que quando comecei a ler o livro fiquei um pouco em dúvida se eu iria gostar, mas essas tramas policiais, quando bem feitas, prendem a gente! É um livro muito gostoso, a leitura flui e nos dá a oportunidade de pensar em muitas coisas, não só sobre o futuro, mas sobre o nosso presente. 🙂

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