Júlia Lopes de Almeida (1862 – 1934) é uma escritora brasileira com uma vasta produção literária e que vem recebendo novas edições de seus livros, o que é muito positivo para a literatura no Brasil, uma vez que suas obras podem provocar no leitor novas construções e interpretações a respeito da literatura escrita por mulheres e o feminismo.

    A autora fez parte das reuniões que formaram a Academia Brasileira de Letras e, por ser mulher, não esteve oficialmente no grupo que fundou a ABL. Apenas em 1977 que a ABL abriu as portas para as mulheres com a entrada da escritora Raquel de Queiroz. Assim, Júlia Lopes de Almeida foi uma mulher de luta e que conquistou seus espaços, mesmo sua época não sendo aberta para as mulheres fora de suas casas.

    Abolicionista e jornalista, ela contribuiu de forma contundente nos jornais da época, pois escrevia sobre o fim da escravidão e direitos civis. Quando mudou-se para Portugal (seus pais nasceram lá), começou a produzir literatura e o seu livro “A viúva Simões” é um de seus primeiros romances.

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    A Viúva Simões, livro publicado em 1897, ainda pode surpreender o leitor, uma vez que a personagem principal Ernestina Simões, apesar de ser um retrato das mulheres burguesas da época, possui um caráter complexo e toma atitudes que demonstram suas angústias entrelaçadas a momentos de insegurança, desejo e manipulação. Ela possui o perfil de uma mulher que viveu uma vida toda dedicada ao casamento e às aparências e, a partir do retorno de um amor da juventude, sua vida se transforma. É como se ela estivesse presa em um casulo e desejasse, por fim, voar.

    Os casulos invisíveis das mulheres

    “Estava num dos seus momentos de melancolia; almejava qualquer coisa que ela mesma não sabia definir. Era a revolta surda contra a pacatez da sua vida sem emoções, contra aquele propósito de enterrar a sua mocidade e a sua formosura longe dos gozos e dos triunfos mundanos.”

    p. 7

    Ao observarmos o romance como um exemplo do machismo estrutural, esse bater de asas da viúva Simões, a faz cair em outro casulo, pois o seu namorado de infância, Luciano, ao retornar da Europa, a enche de esperança por uma vida amorosa que não se concretiza.

    Ao decorrer da obra, o leitor irá conhecer Sara, filha de Ernestina com o seu falecido marido. Fica evidente outro ponto comum aos casamentos tradicionais, pois segundo a própria viúva Simões, está em Sara a sua verdadeira alegria. E Sara, em suas atitudes, representa um choque de gerações, apesar de também cair de forma trágica, como nos romances góticos, nas amarras do patriarcado.

    Já o personagem Luciano, encantando em um primeiro momento por Ernestina, se mostra superficial e machista, pois preocupa-se com o fato de seu amor de infância não ser mais jovem, como se ele também não tivesse sofrido a passagem do tempo.

    A viúva Simões

    Motivações amorosas, ameaças e fracassos

    Aos poucos, Luciano começa a ver Ernestina como uma ameaça, por sua beleza e poder de sedução. Entretanto, neste mesmo momento, a viúva Simões se vê cada vez mais entregue à sua paixão de infância. No decorrer da história, de narrativa simples e fácil de ler, as intrigas vão crescendo até chegar ao interesse de Sara também por Luciano.

    É muito interessante observar a trama construída pela autora, pois uma história que tinha tudo para ser mais uma sobre amores românticos, desconstrói essa ideia e nos entrega uma tragédia social, muito comum até hoje em dia, sobre as mulheres e seus casulos patriarcais.

    Um grande destaque no livro são os diálogos, pois são construídos de uma forma sincera e honesta, sem a necessidade de colocar os homens, principalmente, como príncipes virtuosos e perfeitos.

    Sara e Ernestina estão sozinhas nessa jornada por uma vida ao lado de alguém, porém, quando os casulos se tornam visíveis para o leitor, é tarde mais para elas insistirem na própria liberdade.

    A Viúva Simões e sua importância para a literatura brasileira

    “De dia para dia as coisas mudam de aspecto e muda a observação dos olhos que as veem.”

    (A Viúva Simões, p. 32)

    Com certeza, na época de seu lançamento, “A Viúva Simões” foi recebido pelo público de outra maneira. Muitas camadas são visíveis hoje no livro por conta da transformação social ao longo do tempo. Ou seja, o espaço que a mulher ocupa na sociedade de hoje é muito diferente do passado e, por isso, ao acessarmos a obra de Júlia Lopes de Almeida, temos muitas oportunidades: de conhecer uma obra atemporal e quase esquecida; de compreender o machismo estrutural e de trazer outros pontos de vista (tão necessários) para o Realismo na literatura brasileira e o contexto histórico pós-abolição.

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