Sinto necessidade de compartilhar por aqui as minhas opiniões sobre qualquer coisa, que eu ache interessante, relacionada à literatura, à educação, artes e afins. Um bom exemplo dessa vontade – que vem junto com a falta de tempo por isso este post agora – é quando li a notícia sobre a alteração dos livros de Machado de Assis, um projeto aprovado pelo Ministério da Cultura, feito por Patrícia Secco, que divulgou ser importante ALTERAR a obra machadiana a fim de ficar mais FÁCIL para o entendimento dos jovens leitores. Olha o absurdo: ALTERAR para ficar mais FÁCIL! Como se o problema fosse o Machado e não o leitor! Uma inversão de papéis tremenda e ainda aprovada pelo governo (isso me lembra a “NovaFala”, do livro 1984, medo!):

    “Entendo por que os jovens não gostam de Machado de Assis (…) os livros dele têm cinco ou seis palavras que não entendem por frase. As construções são muito longas. Eu simplifico isso.”

    Eu adoro adaptações, todas as artes ganham quando o assunto é pegar emprestado uma ideia: livros transformados em filmes; romances em séries de televisão; contos em HQ; teatro em novela; etc. Tudo isso é muito interessante, pois mesmo sofrendo transformações, é em nome de uma outra arte, um novo molde, uma nova linguagem, um outro olhar. Mas, pegar um texto de Machado de Assis e alterar palavras “difíceis” por outras mais comuns é chamar o jovem leitor de burro e deturpar uma obra de arte. O dicionário tá aí pra isso, e nem falo de dicionário em papel, pouco usado em tempos de Google, mas dos dicionários on-line, aplicativos para celulares, tablets, etc. É necessário que o jovem leitor saiba buscar a informação, correr atrás de sua dúvida, do mistério, afinal, aguçar a curiosidade é uma das funções da literatura.

    Mas por que o jovem leitor não gosta de Machado de Assis? Porque o texto dele (assim como todos os clássicos) não dialoga com leitores iniciantes, de um país que a qualidade da Educação (não só da escola, mas da família também) vai de mal a pior.

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    O que o jovem leitor quer é se envolver, se identificar com um personagem, tomar aquela história para ele mesmo, como uma oportunidade de compreensão. Crepúsculo e afins estão aí para provar que é muito importante para o jovem leitor que a história convença-o que a sua vida real é tão interessante quanto a ficção e dessa forma, ele abraça e não solta nunca mais aquela ideia. E isso acontece por conta da linguagem do texto, que não possui ligação direta com ter ou não palavras difíceis, mas sim com o jeito em que a história está sendo contada, a rapidez dos diálogos e ações.

    Assim, entre os jovens leitores é muito comum a frase “não gostei de tal livro porque tem muitas descrições”. Isso significa que o jovem não está preparado para as nuances da língua portuguesa, toda a sua beleza, complexidade e profundidade, tão perfeitamente representada por Machado de Assis.

    Então, como um jovem vai gostar de uma obra clássica? Segundo Patrícia Secco, é só trocar as palavras difíceis e o problema estará resolvido. Que terrível engano! Há um buraco enorme entre os clássicos e os jovens leitores, a falta de vocabulário é apenas uma delas.

    A literatura é uma escada infinita, degrau a degrau, nós nos fazemos leitores (o vocabulário aumenta, a interpretação fica mais complexa, a análise cada vez mais crítica, a curiosidade sobre os escritores cresce… até que ler um clássico se torne algo indispensável para a vida). Ao ficarmos nos primeiros degraus, vestimos a faixa da mediocridade, da ignorância, do não saber analisar e interpretar. Patrícia Secco com essa péssima ideia de alterar uma obra de arte presta um desserviço à literatura e a educação, pois promove a simplicidade do que temos de mais especial: o ato de aprender.

    O site Avaaz está promovendo uma petição para que o Ministério da Cultura impeça a alteração de palavras originais nas obras de língua portuguesa. Eu já assinei. 

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