Eu tenho alguns cadernos de anotações literárias – sem muitas pretensões ou organizações, pois eles são um pouco bagunçados. Mas hoje, reorganizando meus cadernos, encontrei uma citação do livro Só garotos, de Patti Smith e também uma anotação sobre o meu impacto quando assisti ao filme Cisne Negro. Então, cá estou compartilhando algo que já não sei ao certo o que é, pois mora no curto espaço da magnificência.

    magnificência
    substantivo feminino
    1.
    qualidade do que é magnífico ou magnificente.
    2.
    atitude generosa; liberalidade, prodigalidade.


    Retornar ao passado pode ser uma decepção para o presente

    Quando fiz uma anotação sobre Patti Smith, em 2011, a considerei importante e hoje, quando li novamente, achei o trecho muito bonito: um lampejo da magnificência que senti no passado retornou.

    Comento isso porque, algumas vezes, quando releio anotações antigas fico sem entender o motivo que me levou a acreditar que aquilo era importante e, por isso, tenho até um certo receio de acessar coisas que li e amei no passado.

    Será que hoje eu também iria gostar? É o que penso e construo essa certeza de que abrir a caixa de Pandora muitas vezes pode ser decepcionante.

    A magnificência está em Patti Smith

    Isso de reler anotações antigas representa as conexões inesperadas da vida e toda a sua magnificência. E Patti Smith personifica exatamene isso.

    • Quem melhor que ela consegue juntar as diversas manifestações artísticas de um modo tão sublime?
    • Quem retorna ao passado e consegue descrevê-los com tamanha força em busca de um momento tão rápido e ao mesmo tempo grandioso?

    Então, sem mais delongas, porque hoje é domingo e preciso viver a vida lá fora. Deixo aqui registrado o trecho do livro Só Garotos que tanto me encantou:

    Quando eu era bem nova, minha mãe me levava para passear no Humboldt Park, pela margem do rio Prairie. Tenho vagas lembranças, como impressões de vidro, de um velho ancoradouro, uma concha acústica circular, uma ponte arqueada de pedra. O trecho estreito do rio terminava em uma grande lagoa e vi sobre a superfície um milagre singular. Um longo pescoço curvo ergueu-se de um vestido de plumas brancas.

    “Cisne”, minha mãe disse, sentindo minha excitação. Ele tamborilou na água brilhante, batendo suas asas grandiosas, e alçou voo no céu.

    A palavra por si mal dava conta de sua magnificência, nem continha a emoção que ele produzia. Sua visão gerou uma necessidade para a qual eu não tinha palavras, um desejo de falar do cisne, de dizer algo sobre sua brancura, a natureza explosiva de seu movimento e o lento bater de suas asas.

    O cisne mesclou-se ao céu. Fiz força para encontrar palavras que descrevessem minha própria ideia sobre ele. “Cisne”, repeti, não totalmente satisfeita, e senti uma pontada, uma saudade curiosa, imperceptível aos passantes, à minha mãe, às árvores ou às nuvens.

    Post escrito ao som de Dancing Barefoot, de Patti Smith

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